Salim, Sócrates, Wlamir Marques e Magic Paula

Três atletas que marcaram a história do Brasil. Sócrates, Magic Paula e Wlamir Marques, ídolos do esporte nacional, deram depoimentos emocionantes aos participantes do I Encontro Temático Esporte, Cultura e Memória, na quarta-feira pela manhã (30/11), na Cinemateca Brasileira

Eles compartilharam lembranças e detalhes de suas trajetórias com os diretores e produtores dos 9 filmes selecionados pelo edital do projeto Memória do Esporte Olímpico Brasileiro.

“Quando a gente fala de olimpíada, emociona. Eu participei de quatro amadoras – porque hoje o negócio é profissional –, mas o espírito é o mesmo. A primeira foi a de Melbourne, em 1956, e nós demoramos 85 horas para chegar!”, lembra Wlamir Marques, um dos grandes nomes do basquete brasileiro. Wlamir foi a quatro jogos Olímpicos e tem duas medalhas de bronze (1960 e 1964). Também conquistou duas vezes o título mundial e foi outras duas vezes vice-campeão.

“A Olimpíada de Roma 1960 foi a mais espetacular que participei. Ali ganhamos a segunda medalha de bronze do basquete brasileiro. Não ganhamos a de prata por conta de um juiz grego, que privilegiou a União Soviética. Roma é a grande saudade que eu tenho”.

Sua última participação como jogador foi no México, em 1968, quando o time ficou em quarto lugar – depois Wlamir foi aos Jogos como comentarista. “Fomos muito criticados por isso, mas hoje, se ganhássemos o quarto lugar, teria até carro de bombeiro esperando”, ironiza.

Magic Paula no Encontro Temático

Magic Paula, ou Maria Paula Gonçalves da Silva, voltou à sua infância para contar a paixão pelo esporte. “Eu nasci em Oswaldo Cruz, no interior de São Paulo e o esporte pintou na minha vida há 40 anos. Eu não tinha esse olhar das crianças hoje de ser uma grande jogadora de vôlei ou futebol. O esporte surgiu como uma brincadeira de rua. Eu não entendia muito bem quando, aos 12 anos de idade, meus pais me mandaram para brincar de basquete fora da minha casa, em Assis. Ainda bem que deu certo, senão eu iria culpá-los pelo resto de minha vida!”, brinca.

Paula foi campeã mundial em 1994 e conquistou a medalha de prata na Olimpíada de Atlanta 1996, além de protagonizar uma vitória marcante dos Jogos Panameticanos de 1991 em Havana contra a seleção cubana. Na ocasião, foi chamada de “bruxa” por Fidel Castro.

Segundo ela, é “impressionante iniciarmos isso [o projeto Memória do Esporte] só agora, depois de tantas histórias que o Brasil tem para contar. Não existe vida sem memória. Temos pessoas geniais que fizeram parte do esporte em uma época em que não tinha divulgação e demorava-se dias para chegar a uma competição. São histórias que nem mesmo nós do esporte conhecemos. Esse projeto vai nos dar a oportunidade de conhecer esses gênios que Brasil teve. Gênio porque fazer esporte nesse país, até hoje, é para abnegados dada a estrutura que se tem”.

“Com 14 anos de idade eu já estava defendendo o Brasil na seleção adulta. Não passei pelo processo natural do juvenil. Sou de uma época em que tínhamos o ‘paitrocínio’ – eles que compravam nossos tênis, minha mãe levava o time para os jogos de Kombi. Memória é valorizar esses detalhes. Essa consciência coletiva que agrega os valores da sua vida. Quando falamos de Olimpíada, falamos de medalhas. Na teoria, o olimpismo é muito mais do que isso. É agregar valores morais, culturais. O que os atletas têm de diferente de outros que sempre estão em busca da perfeição, de querer chegar, de conviver diariamente com o vencer e perder?”, completou. Para ela, “infelizmente nós pensamos muito no imediato. O esporte brasileiro vive de imediatismo. Não somos um país que se preocupou em guardar essa memória dos gênios do passado. Agora é correr atrás do tempo perdido, dessas histórias, com seu jeito, seu olhar”.

Sócrates também se inspirou em suas memórias de criança para falar sobre o esporte e o envolvimento com o futebol: “Eu vejo o esporte como um processo educacional. O esporte te ensina ao convívio social. Nele você tem o primeiro contato com múltiplas experiências de vida. Em nosso país existem alguns esportes bastante elitizados, mas o futebol não. Sua prática é estimulada independentemente das origens. Eu tive o privilégio de, ainda criança, conviver com a realidade brasileira. Com a fome, o desemprego, raças diferentes, níveis educacionais distintos. E isso me inspirou muito, eu pude viver isso. Muitas vezes fui em casa de amigos e tive o privilégio de dividir com eles um prato de comida – bem diferente do que me foi oferecido a vida toda. E isso te dá uma bagagem, uma responsabilidade muito importante. Que tipo de pessoa nós estaremos mostrando? Que experiências e dificuldades? Como eles conseguiram sobreviver?”

Salin e Sócrates

O jogador de futebol falou ainda sobre o esporte como cultura. Disse ter crescido na biblioteca do pai, um autodidata, e vivenciado o regime militar de perto. “Quando veio o golpe eu tinha 10 anos e tivemos que abrir mão de livros que poderiam ser interpretados como agressivos ao regime que se avizinhava, para não sofrermos as consequências. Com 14 anos eu recebi a notícia da morte de Martin Luther King, que eu sabia mais ou menos quem era. Nesse mesmo ano, comecei a acompanhar a movimentação em Paris, na Sorbonne. E depois vieram os Panteras Negras na Olimpíada do México. Mais velho, em 1972, também assisti ao Massacre de Munique. A paixão pelo esporte me fez buscar mais culturas”.

Para ele, “o esporte é fascinante. Muito mais importante que a vitória, trata-se de você atingir seu limite. Eu nunca me esqueço da maior vitória que eu vi na vida: quando uma corredora de maratona chegou absolutamente exausta, com câimbras, sem disputar nada, mas fez questão de terminar a prova. Ela estava disputando o direito de chegar ao final da prova que ela se propôs a fazer. Isso é muito mais importante que qualquer vitória. Até porque a vitória não é importante, ela não nos ensina, nos emburrece. A derrota nos faz reavaliar quem somos, o que somos, quem pretendemos ser, como crescer enquanto seres humanos”.

Roberto Salim, jornalista da ESPN que mediou a mesa, também compartilhou histórias como, por exemplo, quando foi entrevistar o jogador de basquete Zenny de Azevedo, o Algodão, que nunca tinha se visto em quadra. “Dá tempo de correr atrás dessas coisas”, disse Salim.

Deixe um comentário

Seu e-mail não será publicado. Required fields are marked *

*