Por Fredi Cardozo,
O presente de Rogério Sampaio
São Paulo, 09 de março de 2013 – A equipe da El Desierto Filmes mal havia chegado a São Paulo (são todos do Rio de Janeiro), quando recebeu a notícia de que o Centro Olímpico estaria impossibilitado de recebê-los em consequência do temporal que caíra no dia anterior. Depois de algumas ligações e da mudança na locação das gravações, fui recebido no tatame do Ginásio do Ibirapuera pelo produtor Pedro Rossi, que apresentou o resto do time. O local da entrevista respirava judô com o treino coletivo que acontecia entre as seleções do Brasil, França e Holanda e também pela espera de dois ídolos da modalidade: Rogério Sampaio e Aurélio Miguel. Foi nesse clima que a reportagem conversou com os ex-judocas e diretores do curta “IPPON – A Superação Olímpica de Rogério Sampaio”, Cavi Borges e Leonardo Mataruna. A empolgação de ambos ao falar desta produção era nítida, pois além de tratar de um esporte vivido por eles o documentário retratará a vida de um de seus maiores ídolos, tudo em uma narrativa cinematográfica inédita nos filmes do gênero. Descubra um pouco mais sobre os diretores e sua produção na entrevista abaixo:
Cavi e Leonardo, como vocês chegaram ao edital e já havia o interesse de vocês em realizar um filme sobre o tema pelo fato de ambos terem sido judocas?
Cavi
O Pedro Rossi (produtor) que viu o Edital. Eu acho que ele viu num site e me ligou ‘Cavi vamos colocar o projeto do Rogério Sampaio’, eu estava meio desanimado, no cinema para se conseguir grana é muita burocracia. Eu sou um cara mais de fazer. Ai quando ele me convidou, ele disse: ‘deixa que eu faço tudo’. Por isso que ganhamos também, porque ele fez. Ele faz cinema também e é muito melhor do que eu fazendo projeto.
Leonardo
O Cavi e eu somos judocas e éramos adversários. A gente acabou crescendo e competindo, ele tinha o sonho de ir para uma olimpíada como atleta e como ele era melhor do que eu, eu estava vendo o meu sonho ficando cada vez mais distante, então tinha que tentar outro caminho, aí me encaminhei para estudar para ir como Comissão Técnica. Ao mesmo tempo, a gente sempre teve uma admiração muito grande pelos medalhistas olímpicos e o Rogério era um ícone pra gente.
Cavi
Esse projeto é muito legal, junta pessoas do cinema, você vê o Cacá Diegues, o Sílvio Tendler, caras consagrados. Esses filmes trazem, de certa forma, uma linguagem diferente que é nova pra televisão, pro esporte brasileiro e pros atletas também. Eles vão ver o filme e eu acho que eles vão estranhar, porque eles não estão acostumados a ver um filme, mas sim uma reportagem. Então, tem toda esta artimanha, por exemplo, a gente vai usar câmeras superlentas, vai trabalhar com imagens de arquivo, vai ter as entrevistas também, mas vai ter uma coisa de cinema. Um ponto de vista cinematográfico. Tomara que a galera goste.
Vocês estão todos dentro do esporte, mas você nunca tinha trabalhado com esporte antes?
Cavi
De esporte eu nunca tinha feito nada. Eu faço muito filme, mas isso era uma coisa que me incomodava. Eu falava que fazia filmes sobre várias coisas e me incomodava muito não fazer um filme sobre esporte, não fazer um filme sobre judô. Eu vivi no judô a minha vida inteira, comecei com três anos de idade e fiquei até meus 28 anos. Eu sempre pensei um dia fazer um filme sobre judô, mas aí surge um projeto novo aqui, outro ali… Esse edital específico para esporte, eu acho que foi fundamental.
Leonardo
O Cavi é um cara que está aí no cinema o tempo todo, está com a base dele consolidada. Eu venho de uma área educacional, sou professor universitário e tudo que trabalhei de filme foi educacional. É um grande desafio trabalhar uma linguagem que não seja institucional para uma de cinema, com o Cavi que tem toda essa bagagem e os próprios produtores também.
Vocês acreditam que o filme vai contribuir para a modalidade, inspirando talvez, a geração atual?
Leonardo
Tudo é a base. A base do nosso judô, que o Rogério cresceu e o Aurélio, era de um judô muito mais tradicional, mais ligado às raízes japonesas e era uma base mais amadora. Hoje é uma base totalmente profissional. Quando eles (Aurélio e Rogério) foram aos Jogos olímpicos era um técnico que era chefe de delegação, médico, enfim, era o cara para resolver tudo. Hoje você pega uma equipe profissional, você tem 29 profissionais trabalhando. Você tem estrategista, fisioterapeuta, nutricionista, bioquímico, médico, etc. Então o atleta só se preocupa com uma coisa: lutar. E naquela época o cara tinha que fazer tudo sozinho, ele tinha até que emprestar quimono, como foi o caso do nosso personagem.
Cavi
Se a gente conseguir passar isto eu acho que vai ser um estímulo. O cara não tinha nada, não tinha estrutura nenhuma e foi campeão olímpico. E agora tem essa mega estrutura aqui.
E como o Rogério recebeu essa ideia do filme?
Leonardo
O mais engraçado são os outros medalhistas olímpicos, que ao saberem que estamos fazendo o filme do Rogério, perguntam: ‘Pô e o meu filme, quando é que vai sair?’
Cavi
É um presente ter sua vida retratada, eu acho que o Rogério está adorando. Eu vejo isso muito agora nas filmagens, ele está sempre muito disposto, está ajudando na produção fazendo contato com os outros atletas. Ele está feliz da vida, ele é de uma época em que as lutas não passavam na televisão, ninguém pode ver, só as finais e trechinhos. Agora no filme todos vão poder ver estas imagens. E eu queria que este filme não fosse só para os atletas, que ele alcançasse pessoas que não são do judô, por isso que a gente está trabalhando esta linguagem cinematográfica bem elaborada e pensada. De certa forma, eu acho que de longo a médio prazo, vai ajudar o próprio judô a se popularizar mais. Vão ter seus heróis retratados.
Leonardo
Inclusive os adversários do Rogério. Os ex-adversários, que são estrangeiros, os caras ao saberem do filme até perguntaram, preocupados, como vamos falar deles, se poderiam ter uma cópia dos filmes, porque eles não têm acesso às lutas. Esse trabalho de pesquisa das lutas foi um processo bem difícil. Para você ter uma ideia, depois da conquista do Rogério ele não tinha visto todas as lutas dele.
E por que vocês acham esta história tão importante para ser contada em um documentário?
Cavi
Os atletas de hoje, desta geração nova, que não viu a olimpíada não lembram mais do Rogério Sampaio. Ele deve passar despercebido aqui para muito atleta de judô. E esse filme de certa forma vai deixar isso lá registrado e guardado. Eu acho que esse filme tem uma importância muito grande sim. Está todo mundo levando muita fé, é uma responsabilidade para nós.
Leonardo
Isso que eu ia falar. Que isso fique na memória, porque a grande questão é a fixação da história. Quantos fatos históricos a gente esta retratando e resgatando, que ate gente que viveu aquela época já tinha esquecido, isso a gente vê nas próprias entrevistas que já fizemos. Às vezes vemos algum dado que o Rogério fala que nem lembrava.
O que vocês estão achando desta experiência de produzir um filme para o Memória do Esporte Olímpico? Como vocês se sentem fazendo parte?
Cavi
Eu estava vendo os outros filmes do Memória e têm filmes de pessoas mais antigas, o Rogério tem 20 anos que rolou. Tem gente que está lá, do início das olimpíadas. Eu vi os sete filmes e fiquei amarradão, porque nenhuma daquelas histórias eu conhecia. Até a Maria Lenk, eu sabia que ela era uma grande nadadora, mas não sabia que ela deixou de ir a uma Olimpíada por causa da guerra, por exemplo. Eu acho que é de fundamental importância para o esporte, acho que registra um pouco o que é o país e mostra esta dificuldade do Rogério Sampaio.
Leonardo
Eu, que sou historiador, quando tive o primeiro contato com a coleção do Memória, a primeira coisa que eu queria fazer era passar para tudo que era aluno. Passar pra todo mundo, porque o conteúdo impressiona. É a história dos nossos heróis, que a gente não conhece e quando a gente conhece passa a valorizar muito mais não só o esporte como as pessoas.
Ficha técnica:
Documentário: “IPPON – A Superação Olímpica de Rogério Sampaio”
Produtora: El Desierto Filmes
Diretores: Cavi Borges e Leonardo Mataruna
Sinopse: A história de Rogério Sampaio rumo à conquista olímpica distingue-se pelo seu forte componente de superação. Ausente por quase três anos de competições oficiais e logo após ter sofrido com a morte trágica de seu irmão Ricardo, seu mentor e companheiro de treinos, o atleta teve que driblar a desconfiança geral. A escolha de um diretor com enorme relação com o judô – cortado às vésperas das Olimpíadas de Atlanta 1996 e Sidney 2000 – conferirá ao documentário um caráter intimista.