Por Hélio Alcântara

A altitude foi um dos principais personagens dessa edição dos Jogos Olímpicos. Os 2.240 metros acima do nível do mar da Cidade do México fizeram com que faltasse ar aos milhares de atletas inscritos nos Jogos, especialmente aqueles que dependiam da velocidade para obter suas medalhas.

Além disso, o “ar rarefeito” contribuiu decisivamente para a avalanche de recordes quebrados na Cidade do México – foram 68 recordes mundiais e 301 olímpicos.

O controle antidoping também se fez presente pela primeira vez na história das Olimpíadas. E o primeiro caso veio de um país normalmente avesso a esse tipo de expediente: a Suécia. Hans-Gunnar Liljenvall bebeu além da conta e foi flagrado com uma quantidade de álcool inaceitável em seu sangue. Liljenvall e toda a equipe sueca acabaram desclassificados da prova do Pentatlo, na qual haviam conquistado a medalha de bronze.

A desconfiança em relação ao sexo de algumas atletas campeãs em edições anteriores ganhou um aliado poderoso. Os testes para comprovação de sexo entraram em campo e fizeram com que algumas atletas do bloco comunista desistissem de competir no México.

Essa edição dos Jogos Olímpicos foi realizada em um mundo absolutamente conturbado. Alguns exemplos: a China comunista vivia a chamada “Revolução Cultural”, conduzida por Mao Tsé-Tung, o que mexia com o equilíbrio de forças entre EUA e URSS. A Guerra do Vietnã atingia seu ápice em relação à participação das forças militares dos EUA, que já se viam diante de uma surpreendente resistência por parte dos vietnamitas do norte. O pacifista negro Martin Luther King fora assassinado, em abril, deflagrando uma série de atentados, saques e explosões em mais de cem cidades americanas. Robert Kennedy, senador democrata e irmão do ex-presidente John Kennedy, também havia sido assassinado – em junho. Em vários países do planeta os estudantes promoveram passeatas, manifestações de protesto e enfrentamento com as polícias (as mais noticiadas por aqui ocorreram nas cidades de Paris, São Paulo e Rio de Janeiro), enquanto as ditaduras militares de extrema direita se instalavam no poder, especialmente na América do Sul. Na Tchecoslováquia, os tanques soviéticos esmagaram protestos e manifestações por liberdade. E, na Cidade do México, sede do grande evento esportivo que tinha “a intenção de confraternização entre os povos”, centenas de estudantes e professores foram assassinados pela polícia mexicana quando protestavam na Praça das Três Culturas, apenas dez dias antes do início dos Jogos Olímpicos.

Nessa atmosfera, os Jogos do México foram abertos oficialmente no dia 12 de outubro de 1968 – 5.516 atletas haviam sido inscritos (4.735 homens e 781 mulheres), de 112 nações que disputariam 172 provas até o dia 27 de outubro. Foi, aliás, a primeira vez em que o número de países participantes ultrapassou a marca de cem.

A IMAGEM E OS DESTAQUES

A imagem que marcou os Jogos Olímpicos do México, em 1968, foi o pódio dos 200m, no Atletismo. Os americanos Tommie Smith e John Carlos, ambos negros, haviam conquistado respectivamente as medalhas de ouro e de bronze nessa prova. Na hora de receber as medalhas, no pódio, ambos levantaram um dos braços, esticando-os e fechando os punhos com luvas negras – essa era a saudação “black power” (Poder Negro) dos “Panteras Negras”, partido revolucionário negro dos Estados Unidos. E, com o punho no alto e a cabeça baixa, Smith e Carlos ouviram o hino americano ser tocado. A cena foi exibida, ao vivo, para o mundo todo. Logo depois, ambos foram expulsos da delegação do país e da Vila Olímpica.

Os grandes destaques dos Jogos do México-68 nas provas de “tiro curto” tiveram na altitude um forte aliado. Nos 100m rasos, por exemplo, o americano Jim Hines correu a prova em 9”95 centésimos, estabelecendo um recorde que só cairia quinze anos mais tarde, com Calvin Smith.

O americano Bob Beamon quebrou o recorde mundial no Salto em Distância (8,90m), saltando absurdos 55 centímetros a mais do que o recorde então vigente. A altitude e o vento forte a favor foram fatores importantes nessa vitória de Beamon, mas sua marca foi aceita.

Nas provas de fundo no Atletismo, porém, a altitude foi vilã. O ouro dos 5.000m veio com tempo inferior ao vencedor da prova nos Jogos de Helsinque-52. E nos 10 mil, o tempo foi então “o pior dos últimos 20 anos”. Recordista mundial da prova, o australiano Ronald Clarke desmaiou ao cruzar a linha de chegada em sexto lugar e passou anos sem se lembrar do que havia acontecido na última volta. Clarke era o atleta que acendera a pira olímpica, nos Jogos de Melbourne-56, quando tinha 19 anos.

Na Natação, uma adolescente americana de 16 anos roubou todas as atenções. Conquistou o ouro em três provas (200m, 400m e 800m livre), transformando-se na primeira nadadora a vencer três provas em uma mesma edição dos Jogos. De quebra, a californiana Deborah Meyer desbancou Mark Spitz, que falou demais. Ao chegar ao México, Spitz declarou que conquistaria sete medalhas de ouro – ganhou duas, ambas em provas de revezamento.

Na Ginástica, a atleta tcheca Vera Cáslavská não tomou conhecimento das adversárias. Venceu quatro medalhas de ouro e duas de prata, ratificando seu quilate técnico, demonstrado quatro anos antes, em Tóquio (três ouros e uma prata).

Dick Fosbury, dos EUA, revolucionou a técnica no Salto em Altura. Todos os atletas saltavam de frente e imediatamente de lado. Fosbury fez a aproximação e saltou de costas, técnica utilizada até hoje nessa prova. O curioso é que inicialmente a técnica demonstrada pelo americano foi rejeitada pelos árbitros. Depois, porém, a aceitaram e homologaram a vitória de Fosbury.

O BRASIL NOS JOGOS DO MÉXICO 1968

O Brasil levou uma delegação de 84 atletas (apenas três mulheres). E conseguiu seu melhor desempenho na década: uma medalha de prata e duas de bronze.

No atletismo, o salto triplo novamente rendeu medalha ao Brasil. Depois do bicampeonato do fenômeno Adhemar Ferreira da Silva, Nelson Prudêncio surgiu com força e levou a prata no Salto Triplo. Por alguns minutos, saboreou a medalha de ouro. Ele havia saltado 17,27m, então novo recorde mundial. Mas na última tentativa do soviético Viktor Saneyev, o sonho de Prudêncio se desfez. Saneyev saltou incríveis 17,39m e levou o ouro.

Para Nelson Prudêncio, o resultado foi simplesmente magnífico. Apenas dois anos antes, ele havia saído do país pela primeira vez. Foi a Portugal disputar os Jogos Luso-Brasileiros. Em depoimento à escritora e acadêmica Katia Rubio, Prudêncio contou que “a ausência de competidores no Brasil não permitia na época resultados mais expressivos”. E foi só em 1967 (um ano antes dos Jogos do México, portanto) que Prudêncio passou a integrar a Seleção Brasileira de Atletismo. A exemplo de Adhemar Ferreira da Silva, Nelson Prudêncio foi um fenômeno.

No Boxe, Servílio de Oliveira conquistou a primeira e única medalha da modalidade em Jogos Olímpicos. Levou o bronze, depois de ser derrotado pelo mexicano Ricardo Delgado, na semifinal dos meio-médios.

Servílio era um dos treze filhos de um pedreiro e viveu a “febre” do Pugilismo, nascida com as vitórias e os dois títulos mundiais de Eder Jofre, no início dos anos 1960. A exemplo de Nelson Prudêncio, no Atletismo, saiu do país pela primeira vez pouco tempo antes do início dos Jogos do México. Em 1967 participou dos Jogos Panamericanos em Winnipeg, Canadá, e dos Jogos Latino-Americanos, no Chile. Sem apoio adequado do COB (Comitê Olímpico Brasileiro), Servílio treinou com abnegação e conquistou o direito de estar nos Jogos do México. E só não foi à final porque encontrou um adversário mexicano na semifinal. E aí, só mesmo um nocaute para não deixar dúvidas de que ele era o melhor.

A terceira medalha veio em uma modalidade que, no futuro, se tornaria a mais vitoriosa do país em Olimpíadas: a vela. Na classe Flying Dutchmann, Reinaldo Conrad e Burkhard Cordes ganharam o bronze.

O Brasil esteve bem próximo de outra medalha. Na Natação, José Silvio Fiolo terminou a prova dos 100m peito a um décimo de segundo dos soviéticos Vladimir Kosinsky e Nikolai Pankin, medalhas de prata e bronze respectivamente. E a Seleção Brasileira de Basquete quase repetiu o feito em edições anteriores. Na semifinal, teve de enfrentar a poderosa União Soviética. E perdeu a medalha de bronze: 70×53.

O Brasil terminou os Jogos do México-68 em 35º lugar.

Quadro de medalhas geral final:

Quando: 12/10/1968 a 27/10/1968

Países Participantes: 112

Atletas: 5516 (masculino: 4735; feminino: 781)

Total de modalidades: 20

Total de medalhas distribuídas: 527

Participação do Brasil: 35º lugar

MEDALHAS BRASILEIRAS

Modalidade: Atletismo

Prova: Salto triplo masculino

Atleta: Nelson Prudêncio

Resultado: Medalha de prata

Modalidade: Boxe

Prova: Mosca

Atleta: Servílio de Oliveira

Resultado: Medalha de bronze

Modalidade: Vela

Prova: Flying dutchman

Atleta: Burkhard Cordes, Reinaldo Conrad

Resultado: Medalha de bronze

 

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