Por Fredi Cardozo,
O roteiro que morreu com o protagonista
São Paulo, 08 de março de 2013 – O filme sobre Nelson Prudêncio, que nasceu para concorrer ao edital do Memória do Esporte, infelizmente morreu uma semana depois com seu protagonista. Mas sua história não deixará de ser contada. O curta “Um homem que voa: Nelson Prudêncio”, que seria narrado pelo próprio Nelson, teve que ser reescrito após sua morte. Os diretores da Bananeira Filmes, Maurílio Martins e Adirley Queirós, conversaram com a reportagem sobre esta mudança de roteiro no intervalo das entrevistas que realizavam, em São Paulo. Segundo os cineastas, a família de Nelson está sendo fundamental na produção do curta, demonstrando muita força e consciência da importância que este filme terá para eternizar o ex-triplista. Maurílio e Adirley sabem do peso que a história de um dos maiores atletas olímpicos carrega e querem retratar isto mostrando o grande homem que Nelson foi dentro e fora do atletismo. A épica final olímpica do salto triplo de 1968, no México, sua medalha de prata naquela edição e o bronze conquistado em Munique (1972), estarão no documentário, assim como a vida de professor universitário e de pai de família. Descubra mais sobre esta produção na entrevista a baixo:
O que trouxe vocês para o Edital e como se deu a escolha do tema?
Maurílio.
Eu já tinha ouvido falar no ano passado e cheguei a acompanhar o projeto, mas por falta de data não tinha como inscrever nada. Já tinha achado bem interessante tanto a proposta do edital, como a de Memória e com o fato de lidar com esporte. Quando vi no site que iriam abrir as inscrições já começamos a pensar na ideia de um projeto. O tema veio através de uma pesquisa, que durou em torno de dois meses e meio.
Adirley.
Eu acho que é basicamente isso. A ideia surge do Maurílio, que começa a pesquisar e trabalhar este material todo. O filme nasce antes que o Nelson falece, então, na verdade, o filme nasce com o Maurilio tendo o roteiro muito definido com a presença do Nelson vivo.
E como é que foi lidar com esta situação do falecimento do Nelson?
Maurílio.
É obvio que tem toda a coisa da tristeza e da lamentação da morte, mas mais ainda porque é um filme completamente voltado pra figura dele. Era um filme em que ele era o personagem e tinha um personagem fictício, em que ele ensinaria este cara o salto – que era justamente usando o Nelson enquanto professor. A gente exploraria toda a coisa da beleza e da plasticidade do salto. Não teriam depoimentos de outras pessoas, não tinha essa ideia. Quando ele faleceu eu estava na casa do Adirley e a gente tinha se reunido justamente pra começar o processo do filme, tinha uma semana que havia sido aprovado. E ai nós recebemos uma mensagem que ele tinha entrado em coma, a partir dai começa um novo processo. Eu fiquei lá por quase dez dias trabalhando todos os dias, porque era um novo roteiro sendo escrito com uma nova ideia e uma nova perspectiva. Do filme anterior não se aproveita nada.
Vocês não são de São Paulo, como está sendo a logística da equipe para as gravações?
Maurílio.
Eu sou de Contagem, o Adirley é da Ceilândia, uma parte da equipe é de lá e uma parte é de Minas. Então tem esse descolamento, mas no que foi proposto até agora as coisas estão correndo. Nós tivemos uma etapa em São Carlos onde tivemos uma sessão de filmagens, antes a gente tinha tido uma de cinco dias de pré-produção, agora tem esta aqui em São Paulo. A gente lida com um espaço que não é consagrado e com pessoas que talvez nunca tenham aparecido em filmes, isto é muito interessante para o processo do documentário, quando você entra na casa do Nelson e conversa com a esposa e os filhos, conversa na cidade, vai à Universidade que ele lecionava. E tem a pressão, do tempo, da produção, do entrevistado e a pressão da própria história, já que você está lidando com um sujeito que tem uma história fantástica. É um dos maiores atletas olímpicos que o Brasil já teve, a gente carrega um peso muito grande, que é o peso de como vamos passar a grandiosidade desse atleta e como vamos imprimir isto no filme.
Que expectativas vocês têm para o filme?
Adirley.
A expectativa que a gente tem é que filme traga o olhar para outras questões também, não necessariamente pelas questões que são ditas, mas as questões que são vistas. Então o filme trabalha com essa coisa da narrativa de depoimento com entrevistas, mas trabalha também com os espaços e com a fotografia, que diz outra coisa que a gente acha sobre o esporte olímpico brasileiro. Eu acho que é um filme que tem a tentativa do diálogo reflexivo.
Como que a família do Nelson Prudêncio esta reagindo ao filme? E vocês também?
Adirley.
A família dele é muito forte, é impressionante como a família dele me surpreendeu. Eles são muito bem localizados, muito inteligentes e muito perspicazes e sabem a importância que esse filme tem. Isso é ótimo. Eu acho que a família é o ponto chave do filme.
Maurílio.
Eu também me surpreendi muito com a força, porque era uma situação muito recente, foi em novembro (o falecimento) e o primeiro contato pessoal que fizemos foi em janeiro. A gente percebe que ainda tem toda uma tristeza, mas como eles lidam bem com a figura do pai, como era o esposo e como era esse trato. E eles são fantásticos de conhecimento a Dona Lúcia mesmo tem um conhecimento de esportes que é fabuloso, vocês vão ver no filme, ela vai citando nome de atletas brasileiros e estrangeiros.
E aquele episódio das quebras de recordes, de 1968. Vocês pensam em contatar os adversários do Nelson da ocasião?
É, foi o italiano Giuseppe Gentile e o soviético Viktor Saneyev. A gente vai tentar algum tipo de contato. O Saneyev, inclusive, deu uma entrevista para a ESPN, dando as condolências para a família e o Gentile, pouco antes da morte, enviou uma carta pro Nelson e o Nelson responde esta carta. De certa forma ele reata este contato depois de 30 e tantos anos, pouco antes do Nelson falecer. Então a gente vai tentar trazer de alguma forma essas duas figuras para dentro do filme.
Pela experiência atual de vocês existe a ideia de participar novamente do Edital?
Maurílio.
Eu acho que já existe. Eu quero muito, gostei mesmo. Eu achei que a maneira que o edital conduz o processo de tudo – desde o envio que é eletrônico, a forma da seleção e até o encontro de dois dias -, acho que das coisas que participei é um dos melhores.
Adirley.
Eu tenho interesse sim de participar do edital. É um edital muito motivador, eu acho. A memória olímpica é muito motivadora. Eu acho que este edital abre uma brecha para outra forma de contar estas histórias. Como a gente falou anteriormente, não necessariamente serão contadas com o mesmo padrão estético e de narrativa. Talvez a gente consiga achar outro padrão que possa ser mais interessante. Eu acho que esse edital abre esta possibilidade.
Ficha técnica:
Documentário: “Um homem que voa: Nelson Prudêncio”
Produtora: Bananeira Filmes
Diretores: Maurílio Martins e Adirley Queirós
Sinopse: Protagonizou a mais contundente e fantástica disputa olímpica pela medalha de Ouro em competições olímpicas, no salto triplo, nas Olimpíadas do México em 1968, juntamente com o soviético Viktor Saneyev e o italiano Giuseppe Gentile, quebrando o recorde mundial e olímpico por nove vezes consecutivas no mesmo dia. Prudêncio conquistou a prata, o ouro ficou com o soviético e o bronze com o italiano.