“Muita gente chorou quando o Ayrton Senna morreu, eu chorei quando o Claudio Kano morreu. Para mim foi muito forte e espero trazer isso para esse documentário”, desabafa Denis Kamioka, da Dreamonoid Brasil, responsável pelo documentário “Claudio Kano, o atleta do detalhe”, Kano não foi medalhista, mas Denis explica que “o que funciona como drama na sua história é que ele morreu um dia antes de embarcar para Atlanta. O final feliz é que seu parceiro, Hugo Hoyama, ainda está aí até hoje, vitorioso.”
Seu filme é um dos 9 finalistas do edital Memória do Esporte Olímpico Brasileiro. Assim como Denis, os demais diretores e produtores participaram hoje do primeiro dia do Encontro Temático “Esporte, Cultura e Memória”, realizado na Cinemateca Brasileira e transmitido ao vivo pela internet.
A mesa de abertura contou com Carlos Magalhães, diretor da Cinemateca Brasileira e representante do Ministério da Cultura (MinC), José Barbosa, gerente de Comunicação Institucional da regional São Paulo-Sul da Petrobras, José Trajano, jornalista e diretor de jornalismo da ESPN Brasil, e Daniela Greeb, diretora-presidente do Instituto de Políticas Relacionais (IPR).
Carlos Magalhães abriu o evento parabenizando as produtoras que venceram o edital e disponibilizou o acervo da Cinemateca e aqueles que estão sob sua guarda para serem uma fonte de imagens para os documentários. “Vocês poderão encontrar em nossos arquivos materiais importantes para os projetos”, afirmou.
José Barbosa comentou a importância da Petrobras investir nessa área: “queremos que todo cidadão brasileiro tenha acesso à cultura e à produção cultural e esportiva. Esta é uma mudança interna, que tem influenciado a empresa. Obrigado por nos ajudar a realizar essa tarefa”.
“Fiquei muito satisfeito quando o ‘Memória do Esporte Olímpico Brasileiro’ foi aprovado e estou ainda mais satisfeito hoje, com vocês reunidos aqui”, disse José Trajano. “É a história do povo brasileiro está retratada nesses projetos. Vamos falar do Brasil em cada filme. Quando falamos de um militar representando o país numa Olimpíada [Guilherme Paraense, Antuérpia 1920], de uma favelada como a Aida dos Santos ou do mesa-tenista Claudio Kano, mostrando a imigração japonesa, não estamos só falando de memória do esporte. É a nossa história”.
Daniela Greeb ressaltou que o Instituto de Políticas Relacionais tem trabalhado na linha da memória, em especial da ditadura, e que o objetivo desse projeto é, até 2016, formar um acervo sobre a memória do esporte olímpico brasileiro. “Isso não é um simples registro, é um ato de cidadania”, constatou, acrescentando que foi muito difícil chegar aos finalistas uma vez que os projetos apresentados tinham histórias e personagens muito interessantes.
Em seguida, cada produtora se apresentou e falou um pouco sobre suas motivações para realizar os filmes.
José Roberto Torero, diretor do projeto “Ouro, Prata, Bronze e… Chumbo!”, da produtora GW São Paulo, compartilhou o porquê do tema: “Antuérpia 1920 é a melhor participação do Brasil até hoje em Olimpíadas. São histórias de uma gente sensacional, de pessoas que se esforçam para a sua vida ser um pouco mais interessante, mais relevante!”. E completou: “Quero me divertir fazendo o filme!”
Já a DIG Produções, cujo diretor é André Klotzel, tratará de José Telles da Conceição, atleta medalhista em Helsinque em 1952. “Quando ele ganhou a medalha, logo depois o Adhemar Ferreira da Silva obteve o ouro e o Telles sumiu das fotos. E nós achamos interessante resgatar sua história de vida”, afirmou sua produtora.
Iberê Carvalho, da Pavirada Filmes e Produções, falou sobre o projeto “Maria Lenk, a essência do espírito olímpico”. “Ela é uma pioneira em vários aspectos, foi a primeira mulher brasileira a participar de uma Olimpíada, fundou a escola de educação física. Começamos a registrar a história dela em 2004, gravando seus depoimentos. Ela era professora, além de atleta, e tinha um jeito de contar história muito bacana. Queremos contar suas aventuras, suas tentativas de ganhar uma medalha olímpica”. Maria Lenk faleceu em 2007 e até o final de sua vida, com 92 anos, estava praticando a natação.
Rafael Terpins, da Bossa Nova Films, acredita que o personagem de seu filme, Adhemar Ferreira da Silva, “era uma pessoa muito carismática”. “Foi o primeiro bicampeão olímpico brasileiro. Também queremos usar a animação para contar essa história. Logo depois que o Brasil perde a Copa de 1950, ele vai a Helsinque e ganha a medalha. E volta e cria uma linhagem do salto triplo, com João do Pulo depois”, conta o diretor de “O Salto de Adhemar”.
“Eu me lembro bem de assistir àquele jogo, eu era um garoto, foi uma semi-final marcante”, afirma Fábio Meira, da Acere Produções Artística e Cultural, diretor do filme “Doze Brasileiras”. O documentário tem o objetivo de contar a história da equipe que introduziu o Brasil na elite do voleibol mundial. A história da conquista da medalha de bronze nas Olimpíadas de Atlanta de 1996 pelo time formado por Fernanda Venturini, Ana Moser, Márcia Fu, Hilma, Ana Flávia, Ida, Ana Paula, Virna, Leila, Fofão, Filó e Sandra.
“Aida dos Santos – uma história de garra” é um documentário sobre a atleta que saiu de uma favela de Niterói para o quarto lugar na Olimpíada de Tóquio (1964), e, depois, para ser professora universitária. A história empolga o diretor André Pupo, da Digimídia: “Ela é uma mulher de garra, negra, que foi para uma Olimpíada com o país há 5 meses na ditadura. Ela está viva e queremos levá-la para Tóquio relembrar esse momento. É impressionante conhecê-la, saber de sua trajetória. O esporte faz parte da vida dela até hoje. Há 6 anos ela competiu no máster como pentatleta. Ela também é muito respeitada no vôlei, que sempre foi a paixão dela”. Pupo explicou que há poucas imagens dessa época. O filme oficial é de Akira Kurosawa, mas a produtora já conseguiu descobrir gravações em Super 8, então na moda no Japão, feitas pela plateia. Uma delas mostra Aida no desfile de abertura da competição, caminhando um pouco sozinha e mais distante da delegação brasileira.
Murilo Salles, da Cinema Brasil Digital, relatou ter entrado no projeto “Reinald Conrad – a origem do iatismo vencedor” “por causa do espírito olímpico”. “Fazer cinema no Brasil é meio olímpico. É um esforço muito grande. E entrei também porque também tenho uma relação muito forte com o esporte, em especial com o futebol”. Salles dirigiu o filme da Copa do Mundo de 1994 e disse se sentir “devedor dos outros atletas, de outras modalidades esportivas, que lutam duro e não têm esse espaço pop do futebol”. “Eu fui a campo buscar quem me despertava esse olhar especial. Fui bem objetivo: qual esporte brasileiro deu mais medalha? Iatismo. Mas Lars Grael e Robert Scheidt já eram muito conhecidos, ainda que mereçam um filme. Queríamos alguém original. E chegamos ao Reinald Conrad, que foi o primeiro medalhista de iatismo do Brasil. O iatismo também tem muito a ver com o corpo. O barco é a extensão do corpo e Reinald inventou isso. Ele foi para o ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) estudar aeronáutica porque queria ser um bom velejador. Ele inventou traquitanas porque ele não era pesado nem grande, e hoje os barcos já vêm com essas criações dele”, contou, empolgado.
“A luta continua – um documentário em 12 rounds”, sobre o boxeador Servílio de Oliveira, único medalhista brasileiro na modalidade (México 1968) também empolga a produtora Debasé Filmes. “Se não fosse o tema apresentado pelo edital, eu não teria conhecido o Servílio e nem esse esporte tão de perto, que eu já admirava pelo balé do corpo”, comentou Renata Sette Aguilar, diretora. Já Marcelo Machado, roteirista, descreve alguns pontos da história do boxeador: “Ele tinha um emprego na Pirelli, onde podia treinar à vontade desde que fosse fora do expediente. Outra questão curiosa é que ele decidiu entrar no boxe ao assistir uma luta do Eder Jofre no Canal 100, no cinema. E agora ele tem a chance de devolver essa motivação para a nova geração que está aí, através de documentários. Ele também é um colecionador obcecado sobre ele mesmo. Ele tem todas as notícias que saíram no jornal desde que ele começou a lutar”.