Documentários 2011

Em 2011,

Aída dos Santos, Maria Lenk, Claudio Kano, José Telles da Conceição, Servílio de Oliveira, Reinaldo Conrad, Ana Moser, Ana Flávia Chritaro, Ana Margarida (Ida), Ana Paula Rodrigues, Ericléia Bodziak (Filó), Fernanda Venturini, Hélia Rogério de Souza (Fofão), Hilma Aparecida Caldeira, Leila Gomes de Barros, Márcia Regina Cunha (Márcia Fu), Sandra Maria Lima Suruagy Lima, Virna Dantas, Adhemar Ferreira da Silva, Afrânio Costa, Dario Barbosa, Fernando Soledade, Guilherme Paraense e Sebastião Wolf, foram os atletas, e personalidades do mundo esportivo que viraram documentários.

A cultura esportiva é patrimônio de uma nação. Preservá-la é mais do que um simples registro. É um ato de cidadania.

Clique em cada documentário abaixo e saiba mais dessas maravilhosas histórias!

México 1968 - A Última Olimpíada Livre

Ginásio do Ibirapuera, ringue de boxe. Pouca luz, muitos pernilongos e nenhum movimento. O cineasta Ugo Giorgetti aguarda o técnico Antonio Carolo. Não, ele não vai se tornar um pugilista. O objetivo é conseguir uma entrevista para seu novo documentário, cujo tema é a Olimpíada de 1968 no México. Carolo foi o treinador da delegação brasileira enviada para a competição, formada por apenas dois atletas: Servílio de Oliveira, medalhista de bronze, e Expedito de Alencar, personagem que simplesmente se perdeu ao longo do tempo.

“Espero que ele me conte mais sobre o Expedito. As histórias sobre os perdedores são as mais interessantes”, comenta Giorgetti. “Você acredita que não tem sequer uma foto do Expedito na Federação Paulista de Boxe?”, lamenta. “E onde ele está agora?”, pergunto, inocente. “Morreu assassinado. Em uma pizzaria. Assalto”.

Carolo, com cerca de 90 anos, demora a chegar e Giorgetti decide que é melhor adiantar o expediente e falar logo com a reportagem sobre seu filme, um longa-metragem que veio a convite do projeto Memória do Esporte Olímpico Brasileiro.

Por que você escolheu falar sobre a Olimpíada de 1968?

Ugo Giorgetti: Porque ela é muito singular.1968 foi um ano diferente no mundo inteiro. Houve as manifestações dos estudantes em Paris; aquelas contra a guerra do Vietnã, nos Estados Unidos; teve a invasão da Tchecoslováquia pelas forças União Soviética; teve as manifestações violentas no Brasil, contra a ditadura da época, e que acabaram no AI-5 (Ato Institucional no 5). Ou seja, há um contexto de turbulência no mundo e um evento esportivo tinha que sofrer inevitavelmente as consequências disso. A Olimpíada de 1968 se dá nesse cenário, completamente diferente de tudo que tinha acontecido antes.

Além disso, ela ocorre num país latino-americano, o que também é uma novidade. Anteriormente, as Olimpíadas foram em países europeus ou desenvolvidos. Então esta também é muito especial por causa disso.

Existe ainda um outro aspecto: havia um mundo que estava terminando e não percebíamos. Era um mundo em que a técnica não estava tão voltada para o mercado. A técnica do homem sempre existiu, mas a partir de 1968, a técnica começa violentamente a entrar no esporte. Se você for pesquisar o equipamento utilizado em 1968, ele diz muito mais respeito aos equipamentos que se usava nos Jogos anteriores do que depois. Todo o profissionalismo, essa superespecialização que ocorre hoje surgiu depois de 1968, na minha opinião. Ou seja, além desse aspecto político, é a última Olimpíada amadora.

Tem um quê de romantismo nisso?

Giorgetti: As mulheres sempre buscam romantismo (risos). Mas eu acho que sim. A maioria dos atletas era amadora, principalmente no Brasil. E nessa Olimpíada ocorreram fatos cuja origem é política. Tudo isso a transforma em um evento singular. Ela começa 11 dias depois de um massacre horroroso que houve na Cidade do México. Havia até quem dissesse que ela não seria realizada. Ela ocorreu apesar disso. Tudo transcorreu relativamente bem mas com muita tensão. Ela é uma Olimpíada fascinante.

Os personagens do filme refletem esse momento do esporte amador?

Giorgetti: Acho que sim. Eles representam o esporte amador. O que precisa ficar claro é que não havia opção para eles. Não decidiram entre ser profissional e ganhar dinheiro ou ser amador. Não é assim. Só havia amadorismo ou um profissionalismo muito precário. As pessoas eram obrigadas a trabalhar nessa vertente. É algo muito mais da época do que da vontade pessoal. Não é um heroísmo. O que de jeito nenhum tira a grandeza de quem trabalhou dessa maneira. Para você ter uma ideia, a maioria da delegação de 1968 viajou em avião da FAB (Força Aérea Brasileira). O patrocínio era só do governo, mas assim mesmo precário. E o país também tinha a precariedade dessa época. Só uma ou duas delegações foram de Varig, mais “privilegiadas”. Era um mundo que vale a pena revisitar.

Tem um recorte de classe nesses atletas?

Giorgetti: Inevitavelmente. Agora nós estamos a ponto de entrevistar alguém do boxe. Essa pessoa não é do hipismo, e nem poderia ser. Há poucos dias, falando com o Raul Lara Campos, treinador de hipismo, ele disse claramente: “eu não posso afirmar para você que o hipismo é só para ricos, mas veja bem, você tem que comprar o cavalo, cuidar dele, viajar com ele. São despesas que é muito difícil alguém patrocinar”. Isso é a diferença entre uma pessoa que pode praticar esporte e alguém do boxe. Há muita diferença de opinião também. Cada um vê a Olimpíada de uma forma. Isso que estamos falando de política pode não ter sido notado por certas pessoas. Outros falam que notaram, que era extremamente visível. A memória é condicionada. Ela é uma invenção nossa. Estamos inventando algo que não é mais palpável. Estamos revistando um fato e ao mesmo tempo inventando essa Olimpíada. O registro dela só comprova que, algum dia, houve essa Olimpíada e que certas pessoas participaram dela. Isso é possível ver no jornal. Mas o que é a verdade dos fatos? É o que fica na cabeça de alguém. E com todas as deformações possíveis, inclusive do tempo. O passado é gozado. Tinha uma frase linda em um livro do Jorge Luis Borges que ele diz algo como “eu estava voltado do enterro e eu percebi que, entre o trajeto do cemitério e da minha casa, o mundo que eu deixei já estava completamente modificado. O outdoor dos cigarros não estava mais lá”. Mas é verdade. A coisa começa a se deturpar, se modificar, 5 minutos depois que ela se dá.

E ela já tem versões?

Giorgetti: Ela já tem versões, recriações. E você fica com a recriação, que também é uma mentira. Vamos fazer uma recriação que não é a Olimpíada. São representações fugazes do que restou na mente de algumas pessoas.

E o documentário será feito a partir dessas memórias?

Giorgetti: Sim. Eu não quero saber de documentos, isso é besteira.

Nem do filme oficial?

Giorgetti: Para você ter uma ideia do filme oficial, um dos momentos que todas as pessoas – mesmo quem não presenciou ou era completamente indiferente à política, alienado – ouviram falar foi o do dois atletas, Tommie Smith e John Carlos, que fizeram a saudação dos Panteras Negras. Na verdade, a coisa mais bonita é o australiano Peter Norman, branco, medalha de prata, que estava entre os dois. Apesar de não ter feito o gesto, ele colocou uma insígnia dos Panteras e foi punido violentamente por isso. Norman os apoiou fortemente. Há quem diga inclusive que as luvas usadas por Smith e Carlos eram dele. A solidariedade era tanta que, quando Norman morreu décadas depois, os dois atletas americanos foram até a Austrália carregar o caixão dele. Para você ver a magnitude que teve esse negócio. E no filme oficial nem se fala do protesto, muito menos da relação deles. E esse não foi o único, houve vários protestos, por exemplo, quando eles são desligados da concentração. Inclusive por atletas de ponta. E isso não é citado no filme oficial.

Enfim, o passado já foi, escapou da gente. Como foram anos bons – nessa Olimpíada eu era jovem para caramba – é legal lembrar. Se o passado não foi trágico, se foram experiências razoáveis, é uma coisa muito interessante. Mas é porque eu era jovem, não porque o passado foi daquele jeito.

Foto: Maíra Kubík Mano

E os personagens são interessantes?

Giorgetti: São muito interessantes. Eu não gosto de uma vertente que está se difundindo muito – e é fortemente promovida pela televisão – que é o de pessoas “emocionantes”. Enquanto o cara não chora, não se tira o close dele. E fica-se induzindo isso na entrevista, perguntando o dia da morte, do caixão. Eu detesto isso. O fato tem que ser emocionante pela sutileza, não pela grosseria.

Como é o outro filme que você finalizou agora?

Giorgetti: Também é sobre o passado. Ele se passa em 1971, em plena ditadura, e é uma visão do período a partir de algumas pessoas daquele tempo que não eram, por exemplo, da luta armada. É um filme que você procura ver a pessoa como ela é e é surpreendido. Existe, por exemplo, um cara super reacionário que tem uma atitude generosa. É um filme cujo objetivo é não ficar no lugar comum de mostrar que, de um lado tinha torturados e de outro, torturadores. Não era só isso. No meio tinha 95% da população. O filme se passa em poucos dias, de um momento histórico, em que as pessoas estão enfiadas lá. Não se escolhe o momento histórico para nascer.

Memória e esporte são temas que têm surgido para você, lembrando do filme sobre o boxeador Eder Jofre [Quebrando a cara] e do Boleiros 1 e 2?

Giorgetti: A memória me preocupa. Me preocupa o tempo. Ele é o único problema que temos na vida. O resto se resolve. O tempo passa com uma velocidade impressionante, você não se dá conta. Não percebemos que ele está passando de modo diário. O tempo é terrível porque você acorda um dia e ele passou. Isso me deixa muito preocupado. E é uma coisa recorrente nos meus filmes. Outra coisa é que você estabelece planos que se desfazem rapidamente. Você acha que vão durar muito e não duram nada. O primeiro documentário que fiz foi sobre o bairro dos Campos Elíseos, aqui em São Paulo [Bairro dos Campos Elíseos, 1973]. Esse bairro foi concebido para ser aristocrático muito antes da Av. Paulista. Era um local de plantadores de café, com alamedas e terrenos com metragem pré-concebida. Era muito civilizado. Vinte anos depois ele era a boca do lixo. Concluo que os projetos feitos são destruídos com uma velocidade espantosa. Parece que não, que somos os mesmos. Parece que quando eu sair daqui serei o mesmo. Mas não sou. A memória é buscar algo que ficou para trás, sem confessarmos para nós mesmo que isso já ficou para trás, que vamos reinventar para nós mesmos. É o que estamos fazendo aqui hoje.

Foto: Maíra Kubík Mano

Mas buscar a história dos outros também e buscar a si mesmo, não?

Giorgetti: Sem dúvida. É uma luta. Tudo que a gente faz é com vontade de perpetuar um pouco a nossa passagem horrivelmente rápida pelo planeta. A sua casa, por exemplo, dura mais que você. É uma luta do homem porque é o único animal que sabe que vai morrer. Os outros animais sentem, mas não sabem. Mas, por outro lado, para a arte é uma benção porque são histórias maravilhosas.

Carolo chega. É hora de Giorgetti deixar o lugar de entrevistado e se tornar o entrevistador.

Além dos documentários médias-metragem, o projeto Memória do Esporte Olímpico Brasileiro também terá um longa, de 52 minutos, cujo título provisório é “Contadores de história”.

O filme reconstituirá a Olimpíada de 1968 no México a partir da lembrança de seus protagonistas. As entrevistas com membros da delegação brasileira já estão sendo feitas pelo diretor convidado, Ugo Giorgetti.

Giorgetti escolheu falar sobre essa Olimpíada em particular por considerar o ano de 1968 muito marcante na história mundial. No Brasil, o Ato Institucional no5 endurecia a ditadura militar e ampliava a perseguição aos seus opositores. Enquanto isso, a Guerra no Vietnã continuava e a contracultura invadia os Estados Unidos, assim como o movimento dos direitos civis. A República Tcheca vivia a Primavera de Praga e a França enfrentava os levantes de maio.

Dentro cenário agitado, o Brasil conseguiu seu melhor desempenho olímpico da década. No México – primeiro país latino-americano a abrigar os jogos – foram uma medalha de prata e duas de bronze.

No atletismo, o salto triplo novamente rendeu medalha ao Brasil: Nelson Prudêncio conquistou a prata. No boxe, Servílio de Oliveira conquistou a primeira e única medalha da modalidade, bronze no peso mosca.

A terceira medalha veio da vela: na classe Flying Dutchmann, Reinaldo Conrad e Burkhard Cordes ganharam o bronze.

A Olimpíada também ficou marcada pela saudação dos panteras negras feita pelos atletas americanos Tommie Smith e John Carlos (foto acima), além de outras manifestações políticas.

Diretor Ugo Giorgetti

Ficha técnica:

Documentário: “1968 – A Última Olimpíada Livre”

Produtora: Canal Azul

Diretor: Ugo Giorgetti

Localidade: São Paulo (SP)

A Luta Continua - Um Documentário em 12 Rounds

Renata Sette, diretora do DOC sobre o pugilista Servílio de Oliveira, respondeu algumas questões sobre o processo de produção do documentário : A Luta continua- Um Documentário em 12 rounds”

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi  pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Intenso; é a palavra que melhor define o processo. Seies meses é um período que, se você não trabalha o máximo por antecipação, tentando prever as surpresas, pode se tornar um tempo muito curto. E mesmo trabalhando dessa forma, tentando imaginar os contratempos, eles nos surpreendem. É fato; não tem jeito. Chega a ser engraçado, depois que passa.

Como todo filme foi preciso lidar com desafios, horários, pessoas das quais dependíamos, respostas que tivemos a tempo ou não. Tudo isso causa ansiedade mas, ao mesmo tempo, coloca você diante de questões que caso não se adapte pode ser pior, sem dúvida. É preciso muita paciência, jogo de cintura. E isso, no final, sempre conta a favor. O balanço é totalmente positivo. Principalmente se conquistamos um resultado bacana, satisfatório. E foi o que aconteceu. Temos um filme do qual nos orgulhamos muito.

Foi intenso mas foi, sem dúvida, sensacional! As surpresas, inclusive.

VALEU!

Porque escolheu fazer um documentário sobre o Servílio e sobre boxe?

Quando começamos a pesquisar a atuação do Brasil nas Olimpíadas e descobrimos que o país só tem uma medalha olímpica no boxe ficamos, primeiro, perplexos. Depois, curiosos. Como é que o Servílio de Oliveira havia conseguido algo que Eder Jofre, Miguel de Oliveira, Popó, Sertão, etc., nunca conseguiram? O que fez dele o único? Aí fomos atrás dessa história. Conhecemos o Servílio, fizemos entrevistas, descobrimos o arquivo enorme que ele tinha de recortes de jornal, fotos… Descobrimos ali o nosso tema. Ao mesmo tempo que é uma história do esporte olímpico, é uma história cheia de interesse humano, obstinação, tragédia, superação.

Outra coisa que nos fez escolher o tema é simplesmente a admiração que temos pelo boxe como esporte em si. A plasticidade, a beleza da luta, das imagens. O boxe já foi tema de grandes filmes, agora queremos fazer um documentário à altura.

Renata Sette, diretora do DOC A Luta Continua.

Qual é o desafio de fazer um DOC com um personagem vivo?

Acho que o maior desafio é fazer alguém confiar em você a ponto de entregar na sua mão a história da sua vida. A minha história é, em primeiro lugar, minha. Minha para contar, exibir, guardar, mostrar para os outros. Como é que eu entrego isso para alguém e depois consigo dormir a noite? Chegar para alguém que você não conhece e pedir isso é muito difícil, acho que em qualquer documentário.

Ao mesmo tempo, é preciso conciliar esse voto de confiança do “documentado” com o respeito ao público, a necessidade de mostrar as coisas como realmente são.

Fora isso, no caso de uma pessoa conhecida, como o Servílio que já foi entrevistado dezenas de vezes, é necessário encontrar fatos novos, informações desconhecidas, acrescentar à história para não ficar repetitivo. Encontrar o homem por trás da medalha e do discurso tão dito em tantas entrevistas- talvez esse seja o maior desafio.

Servílio na gravação do Documentário “ A Luta Continua- Um Documentário em 12 rounds”

O nosso processo para a realização do Doc era, a partir do argumento/roteiro inicial, fazer uma pesquisa filmada, escolher os entrevistados a partir dela (não era possível ficar com todos que entrevistamos em função do tempo do Doc; 26’) e definir quais deles fariam parte do filme. São inevitáveis as mudanças pelas quais um documentário passa nesse processo de pesquisa. Descobrimos novas pessoas e possibilidades ainda não pensadas; exemplo disso é o Rafael, um menino de 11 anos que treina boxe em Rio Claro e que passou a fazer parte do filme quando vimos as semelhanças entre a personalidade, idade, escolhas e história dele com a do Servílio. O Rafael e o universo dele e da escola onde treina em Rio Claro foram um rico acréscimo para o filme.

De outro lado outra mudança ocorreu em função do falecimento de um dos personagens: o Sr. Antônio Carollo, técnico de toda a vida do Servílio. Fizemos uma entrevista com ele dois dias antes do seu falecimento, foi uma surpresa. Para o DOC tínhamos pensado em surpreender o Servílio e levar o Carollo ao encontro dele numa sala de cinema, onde o atleta, com 11 anos de idade, viu uma primeira luta do Éder Jofre em 1960. Diante desse acontecimento tivemos que mudar os nossos planos e promover o encontro de outra forma.

Outros entrevistados tiveram sua presença aumentada pelo fato de terem acrescentado um bom conteúdo ao filme. Dessas forma outras entrevistas podem ficar de fora. Uma das características mais magníficas no formato documentário é a liberdade para deixar que algumas coisas mudem no processo. Isso é o máximo. Dar a abertura a tais mudanças é válido e pode acrescentar ao filme, mesmo porque elas são inevitáveis.

Dênis, pugilista mirim

Quem vc entrevistou? Como foram as entrevistas?

Entrevistamos: Servílio de Oliveira, Victória Chalot (sua esposa) e os irmãos: Silvério, Sinésio, Sônia, Silvana e Silvanete. O filho Gabriel de Oliveira.

Conversamos e convivemos muito com os profissionais de boxe que nos auxiliaram e foram nossos consultores na escolha de todos os atletas e profissionais que participaram do documentário: Xexeu Tripoli, do Palmeiras, e Breno Macedo, que trabalha no Palmeiras com o Xexeu. Ele é um estudioso do esporte, estudante de História na USP e nos finais de semana professor de Boxe na escola da sua família, em Rio Claro.

Entrevistamos Éder Jofre, Antônio Carollo e o pugilista mirim Rafael Bombonatti.

As entrevistas foram muito boas. Algumas, das quais nem esperávamos tanto, nos surpreenderam. As conversas com o Servílio foram boas descobertas; francas. Conseguimos ver por trás da sua preparação e oratória, sentimentos novos e fatos até então não muito explorados.

Servílio de Oliveira, único medalhista olímpico brasileiro no boxe

Em 1968, o Brasil recebeu sua única medalha olímpica na modalidade boxe. O autor da façanha foi Servílio de Oliveira, ganhador do bronze.

Alguns anos antes, em 1963, aos 13, influenciado pelos irmãos mais velhos, começou a freqüentar à academia Caracu Boxe Clube, na rua Aurora, próxima a praça da República, centro velho de São Paulo, capital.

Em 1965, com o fechamento da academia Caracu, se transferiu para a academia Flamingo, da rua Florêncio de Abreu, travessa da Avenida Senador Queiroz. Lá, em 1966, na rodada final do tradicional Campeonato de estreantes de “A Gazeta Esportiva”, no Ginásio do Pacaembu lotado, derrotou por pontos ao também jovem Mourival Rodrigues Maia, do Clube Esportivo da Penha.

Hoje, aos 63 anos, Servílio ainda é apaixonado pelo boxe, fazendo movimentos até mesmo enquanto fala. Esquivas, jabbings, provavelmente inconscientes, acompanham seu discurso. Ele nunca trabalhou em nenhuma outra profissão.

O documentário será dividido em 12 minicapítulos, como os 12 rounds de uma luta. Cada um terá vida própria, com começo, meio e fim. Contam uma história, um conflito, uma solução, uma vitória ou uma derrota. O boxe imita a vida e “A luta continua” imita o boxe.

Teaser do documentário “A luta continua”

Ficha técnica:

Documentário: “A luta continua – um documentário em 12 rounds”

Produtora: Debasé Filmes Ltda.

Diretora: Renata Sette Aguilar

Localidade: São Paulo (SP)

Aida dos Santos, Uma Mulher de Garra


André Pupo é diretor do Doc , Aída dos Santos, uma mulher de garra.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Foi realmente um privilégio poder contar parte da história dessa personagem maravilhosa que é Aida dos Santos, uma atleta que representa tão bem os heróis olímpicos brasileiros: Aqueles que muitas vezes tiveram seus talentos desperdiçados por falta de visão da política de esportes no Brasil. Enfrentando preconceitos, solitude e desamparo, Aida conseguiu um feito inédito, o quarto lugar em Salto em Altura na Olimpíada de Tóquio em 1964.

Isolada do resto da delegação brasileira, Aida improvisava na comunicação para treinar sozinha na Vila Olímpica feminina. Sem opção, Aída se entregou ao hábito de se transportar de bicicleta para os treinos, fato que a fez superar marcas históricas de impulsão, causando um resultado inesperado que a ajudou no dia da prova. Sem nenhum apóio técnico, a negra, filha de lavadeira do Morro do Arroz em Niterói teve uma garra realmente impressionante.

Pelo fato do Japão ser um país tão mítico quanto longínquo, Aída nunca havia voltado ao lugar que a consolidou no hall da fama do esporte brasileiro. Nossa equipe resolveu mudar essa história e a levamos de volta à Tóquio. A idéia era voltar com a protagonista 48 anos depois para o local onde ela se hospedou, andou de bicicleta e viveu o seu maior feito no esporte. Aída voltaria a pisar no “Estádio Nacional de Tóquio”.
A “Professora” ,como é conhecida Aida pelos amigos, é uma senhora de 75 anos, avó de dois netos e jogadora de voleibol master. O fato de Aída ainda estar na ativa, tornou a nossa viagem muito mais rica, fazendo com que o compromisso e a disposição de Aída se tornasse um exemplo para toda equipe.

Sabíamos que voltar ao local da prova seria a forma perfeita de trazer à tona a memória da protagonista revivendo a emoção dos fatos e trazendo uma forma original de contar uma história repetida a exaustão pela personagem durante todos esses anos. Dito e feito: O encontro com o estádio foi verdadeiramente emocionante e especial. Só resta a nós a expectativa de termos tido a competência para transmitir essa emoção.

Para falar do início no esporte e a história que precede a Olimpíada de 1964, gravamos depoimentos com a personagem no Botafogo e na pista de atletismo Célio de Barros, lugar onde ela treinou durante toda sua carreira. Além disso, encontramos também com Francisco antigo morador das proximidades da pista que, quando criança, ajudava Aida nos treinos, e que ainda se diz seu fã numero um. 48 anos depois, Francisco faz questão de dizer que continua inconformado com a falta de incentivo que a atleta teve na época.

Para conseguirmos documentos como estes, além do planejamento, contamos também com o acaso que qualquer documentário necessita para ser feito. Neste aspecto, acreditamos que fomos muito bem sucedidos.
Agradecemos a oportunidade e esperamos que todos gostem e se orgulhem dessa brasileira que é um exemplo para todos nós.

Gravação do documentário sobre Aída dos Santos

Pq Aída dos Santos? Fale sobre o processo de criação

Nossa busca teve foco em uma figura que tinha tudo para ser medalhista e não foi. A nossa surpresa, ao encontrarmos o nome de Aída dos Santos em nossa pesquisa, foi descobrir que a atleta possuía as características contrárias à que pensávamos estar buscando. Aída tinha tudo para não ir às olimpíadas e contou somente com sua própria garra para garantir o quarto lugar. Quando entramos em contato com sua história, descobrimos que ela era realmente a pessoa certa para explorarmos.

Conte sobre as entrevistas. Quem vc já entrevistou? O que mais te chamou a atenção?

Nossa guia é Aída e ela se posiciona como tal. Entrevistamos Aida no complexo de atletismo Célio de Barros e na sala de troféus do Botafogo. É difícil que uma mulher de 75 anos seja espontânea ao contar sua estória repetida a exaustão, esperamos muito dos depoimentos de Aida durante a sua viagem para Tóquio onde estaremos ancorado no lugar onde tudo aconteceu, trazendo as lembranças a tona.

Gravação do documentário sobre Aída dos Santos

Quais são suas expectativas? Como vc quer que fique o DOC?

Através de uma narrativa direta da própia personagem queremos passar a solidão no dia a dia de Aida nas Olimpíadas. Mostrar a importância de Aida para o esporte olímpico nacional como uma atleta que alcançou uma colocação digna apenas com a sua determinação e nenhum apoio da Confederação de Desportos, na época o órgão que coordenava os esportes amadores, para que nunca se cometa mais um descaso como esse e que outros talentos sejam desperdiçados.

O que as pessoas vão encontrar quando assistirem Aída dos Santos, uma mulher de garra?

Esperamos que o espectador sinta-se na pele de Aída em toda sua trajetória para chegar em Tóquio. Estamos focando na mistura do drama com o documentário justamente para buscar essa identificação, ao mesmo tempo em que pretendemos ilustrar a surpresa e a emoção da saltadora ao voltar para o palco que a consagrou como referência mundial do Atletismo.

Aida dos Santos

O projeto “Aida, uma história de garra” pretende resgatar a memória da saltadora em altura Aida dos Santos e reviver sua trajetória na primeira Olimpíada que disputou. O documentário reconstitui a história escrita há mais de 40 anos, nos jogos de Tóquio 1964, quando ela obteve o quarto lugar na prova de salto em altura.

Única mulher na delegação brasileira daquele ano, Aida competiu sem treinador, patrocinador, tênis ou uniforme próprios. Havia conquistado a vaga em Tóquio às vésperas da competição, quando alcançou o índice olímpico ao praticar o esporte por diversão. Também a única sul-americana lá, Aida cravou um lugar na história simplesmente por estar numa competição daquelas: era uma brasileira, negra, sem estrutura de treinamento, com o país no início da ditadura militar, contra nações muito mais desenvolvidas inclusive em termos esportivos!

Sem a ajuda de ninguém, ela mal conseguiu preencher a ficha de inscrição, toda em inglês. Seu nome não constava na relação de atletas brasileiros e ela não pode retirar o material para competir. Nas eliminatórias, obteve a classificação às custas de uma torção no pé – estava acostumada a cair na areia, não na espuma. Movida apenas de garras e com uma sapatilha emprestada de um corredor cubano para a grande final, Aida voltou ao Brasil como heroína e representa o melhor do espírito olímpico.

André Pupo apresenta projeto

Ficha técnica:

Documentário: “Aida dos Santos, uma história de garra”

Produtora: Digimídia Recursos Digitais Ltda.

Diretor: André Pupo

Localidade: São Paulo (SP)

Brilho Imenso, A História de Claudio Kano


Denis Kamioka segura a raquete nervoso. Vai lançar uma bola para um de seus ídolos, Ubiraci Rodrigues da Costa, o Biriba. “Quando eu era criança tinha uma raquete que chamava ‘Biriba’, mas na época eu não sabia quem era. Achava que era alguma marca, não um dos maiores jogadores de tênis de mesa da história do Brasil”, revelaria mais tarde.

Denis Kamioka, diretor do Documentário Claudio Kano, o atleta do detalhe.

Estamos em um dos muitos estúdios da Vila Leopoldina, em São Paulo, acompanhando a gravação do documentário “Claudio Kano, o atleta do detalhe”, um dos finalistas do edital Memória do Esporte Olímpico Brasileiro. Depois de alguns minutos, Denis, o diretor do filme, desiste de bater bola com Biriba. Acha que a responsabilidade é muito grande. Convoca então o pai de Claudio Kano, Minoru, para a tarefa.

Minoru e sua esposa Mitiko chegaram cedo para as filmagens naquele sábado. Estão claramente emocionados ao ver a história do filho, falecido em 1996, passar para as telas. “É importante deixar para os mesa-tenistas do futuro. Meu filho foi um exemplo, por isso é feito um documentário. É bom para os atletas que vem vindo”, diz Minoru, sob os ouvidos atentos e olhos comovidos de Mitiko.

Sr. Minoru e Sra. Mitiko, pais de Claudio Kano acompanham a gravação do documentário sobre o filho

O cenário é simples: uma mesa para jogar, algumas raquetes, muitas bolinhas e uma iluminação forte. O segredo está na imagem. A equipe da Dreamonoid Brasil utiliza uma supercâmera que grava 2 mil frames por segundo, dando um detalhamento impressionante à cena. Assim, cada saque, cada cortada, cada expressão do jogador podem ser vistos em uma velocidade muito lenta e rica em detalhes. “Você pode ver uma bexiga explodindo no ar”, comenta Denis.

Além de Biriba e dos pais de Kano, outros atletas e amigos também são convocados para as gravações. Entre eles, Gustavo Tsuboi, atualmente o primeiro no ranking brasileiro de tênis de mesa. Tsuboi, de 26 anos, participou da Olimpíada de Pequim (2008) e agora prepara-se para ir aos jogos de Londres. “Eu não conheci o Claudio Kano. Ele faleceu na véspera da Olimpíada de Atlanta, em 1996, e eu comecei a jogar em 1997. Então não tive a oportunidade de conhecê-lo. Só vi vídeos e relatos das pessoas que conviveram e jogaram com ele. Mas eu sei que ele teve um papel muito importante para o tênis de mesa brasileiro porque na época não tinha tanto apoio como hoje. Ele desenvolveu um papel de abrir portas para o Brasil no exterior. Ele participou de treinamentos no Japão e na Europa, e o pessoal lá viu que o brasileiro tinha talento e era esforçado. Isso abriu vários caminhos para as gerações seguintes. Devemos isso a ele”, diz Tsuboi.

Gustavo Tsuboi, considerado o melhor mesa tenista brasileiro da atualidade

Para o jovem atleta, participar de um filme sobre Kano “é o mínimo” que ele poderia fazer. “É uma contribuição, ele fez tanto pelo tênis de mesa. Até hoje as pessoas ainda falam muito e lembram muito dele, pelo seu jeito carismático de brincar, de não diferenciar ninguém. É um ídolo para todos nós, é uma honra para mim participar do documentário e ajudar o tênis de mesa a evoluir cada vez mais”.

Esse é o terceiro dia das filmagens. “Vamos filmar 15 diárias e entrevistar 26 pessoas. Se cada uma falar um minuto, já deu o documentário”, brinca Denis. “Exageramos um pouco. Mas a ideia era homenagear, nem que fosse por 30 segundos, pessoas relevantes para o tênis de mesa no Brasil e para a história do Claudio Kano”.

Bastidores da gravação do documentário sobre o mesa-tenista Claudio Kano

“O que vai ser editado ou não, ainda não temos ideia, mas até agora já ocorreram muitos momentos bonitos”, comenta. “Alguns nem foram na frente das câmeras. Um dos personagens é um grande amigo do Kano. Colocamos nele um microfone de lapela para fazer a entrevista e ele pediu para ir ao banheiro. A gente não estava mais gravando, mas o técnico de áudio estava ouvindo tudo. Ele foi ao banheiro, sozinho, e falou: ‘Porra, Claudio, você vai me fazer falar de você mesmo, né’. E aí ele voltou e deu um relato super emocionado”, lembra Denis. E completa: “Ou seja, dá para ver que a gente escolheu a pessoa certa para fazer o documentário. É um cara muito amado, que não é só um talento como atleta, mas que era especial como pessoa. Todo mundo fala bem dele. Era um cara muito humilde e carismático. Conforme estamos fazendo o documentário, vamos descobrindo que ele é o grande herói do tênis de mesa no Brasil”.

“Apesar de não ter ganho medalha ou ter aparecido na mídia tanto quanto outros esportes, o que eu acho que é uma grande contribuição do Kano é ser sexto em um mundial em uma categoria que não tinha nenhuma tradição no Brasil. E nenhum brasileiro bateu essa marca. Ele foi um divisor de águas. Quando a equipe brasileira chegava em uma competição, ia bater bola com os japoneses, com os chineses, com atletas top, porque ele era conhecido. Antes dele e depois, o normal era o Brasil bater bola com Trinidad e Tobago, com o Chile. Ele foi o embaixador do tênis de mesa do Brasil”, argumenta Denis.

Sobre o filme, ele detalha que vai usar a animação como recurso para os “momentos-chave” da história de Kano. “Já começamos a animação. Ela vai ser mais uma reconstituição das imagens que não existem nos arquivos. E mesmo as que existem são muito ruins. Na época as câmeras profissionais eram VHS, então é difícil apreciar. Muitas vezes não conseguimos nem enxergar a bolinha porque ela vai a 130 km/h e nas câmeras antigas não é possível ver”.

Na avaliação do diretor, o projeto pode ajudar a chamar atenção para o tênis de mesa, contribuindo inclusive para aumentar o registro de imagens desse esporte. “O Brasil não tem um tênis de mesa top. Tudo é muito amparado pela família, não tem patrocínio e nem mídia. Consequentemente, poucos conseguem se dedicar com exclusividade. E daí não temos atletas competitivos. É um círculo vicioso”, analisa.

Denis Kamioka, diretor de “Cláudio Kano, o atleta do  detalhe”, vibra ao falar sobre o mesa-tenista: “homenageá-lo homenagear todo o  esporte. Ele foi um ícone, tem uma história incrível de vida. É um atleta que o  Brasil ainda precisa conhecer”. Kano participou de duas Olimpíadas, Seul (1988)  e Barcelona (1992) e morreu num trágico acidente de moto pouco antes de embarcar  para Atlanta (1996).

Ficha Tecnica:

Documentário: Brilho Imenso, a história de Claudio Kano

Diretor: Denis Kamioka

Localidade: São Paulo (SP)

Cláudio Kano não chegou a ser um medalhista olímpico.  Mas sua carreira, desconhecida para a maioria dos brasileiros, reúne elementos  muito especiais, que revelam o perfil não só de um grande atleta, mas de um  verdadeiro ídolo. Estudioso e detalhista, Kano começou a praticar o tênis de  mesa com apenas 9 anos de idade. Dono de um estilo único de jogo, foi cinco  vezes campeão brasileiro, quatro vezes campeão sul-americano, seisvezes campeão  latino-americano e ganhou 12 medalhas Pan-americanas.

Cláudio participou de duas Olimpíadas, Seul e Barcelona,  e encerraria sua carreira em Atlanta. Sua meta era figurar entre os 8 maiores da  competição. Ele havia passado 3 meses no Japão, treinando intensamente, e  emagrecera 9 quilos, atingindo o auge de sua forma física. No entanto, um dia  antes de embarcar, Kano sofreu um acidente de moto e acabou falecendo. A  carreira de um dos maiores mesa-tenistas do Brasil acabava  ali.

Contar esta história é uma maneira não só de homenagear  a memória de Cláudio Kano, mas também de realizar registro inédito sobre a  modalidade em nosso país. Embora seja um esporte extremamente plástico e  interessante imageticamente, nunca foi feito um documentário nacional  aprofundado sobre o tema.

O filme também pretende divulgar, incentivar e estimular  o desenvolvimento futuro deste esporte, o mais popular do mundo – são 40 milhões  de praticantes. Aqui, o famoso ping-pong faz parte da vida de muitos brasileiros  como brincadeira dinâmica, mas o esporte levado a sério, com estatuto de  competição olímpica, ainda tem muito a crescer.

De Olaria a Helsinque: A História de um Salto


André Klotzel, cineasta com vários filmes em sua trajetória, entre eles A Marvada Carne e Reflexões de um liquidificador, é diretor do DOC: De Olaria a Helsinque: a história de um salto, sobre o atleta José Telles da Conceição.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Eu teria que manter um diário para me lembrar do que foi percorrido nessa trajetória. Para mim o processo de um filme é como um caminho em que se tem planejado o ponto de chegada mas não se sabe exatamente por onde percorre a trilha para chegar lá.

E a coisa mais importante neste percurso foi o envolvimento com o personagem. Eu admirava o José Telles da Conceição mas não tinha muita consciência da personalidade dele nem do que ele representou em sua época, principalmente para colegas, amigos e família. Descobri que atrás do grande atleta existia o bom caráter, bon-vivant, com um humor tipicamente carioca. Uma pessoa leve, elegante e altiva mas sem falso-orgulho, sem nada de postiço na sua imagem.

Sem jamais ter visto ele, só aprofundando o conhecimento pelas histórias que as pessoas contavam e as fotografias que ainda restavam, o Telão me encantou. E acho que isso foi o mais importante, porque fui ficando cada vez mais convicto da justeza de fazer essa pequena biografia (e tenho certeza que o personagem não se esgotou, existe muito ainda por contar).

Como cineasta, permanecer acreditando em uma história até o fim é o mais importante, porque mantém o processo íntegro, mesmo que o percurso vá se alterando ao longo da trajetória. E isso dá uma sensação de recompensa que justifica todo o envolvimento.

Porque José Telles da Conceição?

Ele é o paradigma do atleta excepcional e esquecido. Excepcional pelas características de talento múltiplo em nível de competitividade olímpica, e esquecido porque talvez nunca foi devidamente festejado, nem no auge da carreira. Em um projeto que se destina a resgatar a memória, nada melhor do que um personagem com estas características.

Klotzel, diretor do Documentário.

Conta sobre as entrevistas? Com quem vc falou? Que histórias vc ouviu?

São muitas histórias e, previsivelmente, não cabem todas em um único filme. Muito menos em uma pequena entrevista como essa. Mas por enquanto ainda foram conversas telefônicas, ou feitas pelo pessoal que está fazendo a pesquisa do filme. Eu evito conversar com o entrevistado antes da gravação, como uma forma de manter uma curiosidade genuína no momento mais importante. Por isso, vou me esquivar de responder essa pergunta…

Gravação do Documentário sobre José Telles da Conceição

O seu pensamento sobre o José Telles e o mundo que o envolve mudou desde o momento que vc começou a se aproximar dele?

Mudou muito. As informações disponíveis no primeiro contato eram muito precárias. Há fatos errados em buscas de internet, coisas mal explicadas na pouca literatura disponível. Ao juntar melhor os fragmentos de informações, receber imagens de pesquisas, ouvir histórias de pessoas que conviveram com ele, muita coisa se esclareceu. Ficou claro que tipo de atleta ele era e isso vai estar no documentário. Esse eu acho que é um grande valor dessa série: ela congrega informações soltas e, tenho certeza, a próxima pessoa que procurar saber sobre o Telles terá uma experiência muito melhor que a minha.

O que vc espera deste doc?

Além de juntar as informações dispersas por aí sobre o Telles, como falei acima, espero falar um pouco sobre o processo da memória negligenciada, que vai aos poucos se perdendo – enfim, falar sobre a memória em si.

José Telles da Conceição é um vencedor vencido. Vencedor porque nasceu pobre e parecia destinado a uma vida de dificuldades. Magro e alto, foi descoberto por um olheiro do Vasco da Gama. A partir daí se tornou um demolidor de recordes, tanto nas provas de velocidade quanto nas de salto.

É um vencedor porque no dia 20 de julho 1952, nos Jogos Olímpicos de Helsinque, alcançou a marca de 1,98 metro no salto em altura e conquistou uma inédita medalhada de bronze. Tinha 21; foi o primeiro representante do atletismo brasileiro a subir a um o pódio.

Mas Telles é também um vencido. Dias depois de ter obtido o bronze na Finlândia e ter se tornado candidato a celebridade, seu triunfo foi ofuscado pela conquista do ouro no salto triplo por Adhemar Ferreira da Silva. José Telles da Conceição desembarcou no Rio de Janeiro com a medalha, mas não com o reconhecimento que merecia.

O atleta conquistou ainda vitórias importantes em Jogos Pan-Americanos e o recorde brasileiro obtido por ele no salto em altura (2m) perdurou por 19 anos.

Este projeto pretende apresentar ao público um superatleta, que podia competir em alto nível nas provas de 100m rasos, 110m com barreiras, 400m com barreiras, salto em distância, salto triplo, salto em altura e até no decatlo. Um fenômeno que quebrou 21 recordes em cinco modalidades diferentes, até encerrar a carreira em 1966.

José faleceu em 18 de outubro de 1974, vítima de um assassinato.

Ficha técnica:

Documentário: “De Olaria a Helsinque: a história de um salto”

Produtora: DIG Produções

Diretor: André Klotzel

Localidade: São Paulo (SP)

Maria Lenk, A Essência do Espírito Olímpico



Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Foi um processo muito rico em vários aspectos. Minha experiência maior era com filmes de ficção, por isso a responsabilidade de se fazer um filme sobre a Maria lenk me assustava um pouco. A etapa de pesquisa , logo de cara, já estabeleceu alguns desafios que teríamos pela frente. O primeiro deles foi constatar que a entrevista que realizamos com a nadadora em 2004 não trazia tantos trechos inéditos como imaginávamos; Isso me fez perceber que para ir além do que outros veículos já haviam ido na tentativa de conhecer quem realmente foi Maria Lenk, precisaríamos reconstruir sua história a partir de depoimentos de outras pessoas; o segundo ponto foi ver que a maioria das pessoas que poderiam contribuir com a reconstrução da memoria de vida de Maria, possuem um enorme respeito e admiração por ela, mas não tinham um relacionamento íntimos com nossa personagem. O que me deixava receoso de realizar um filme frio e institucional. O caminho encontrado foi ir até os Estados Unidos para encontrar seus filhos, netos e bisnetos, e assim desvendar um lado íntimo de sua personalidade, que poucos conheceram; o terceiro ponto descoberto durante o processo de pesquisa e que veio a pautar todas as decisões futuras, foi que infelizmente não existem muitas imagens da época em que Maria competiu nas Olimpíadas. A fase de atleta de alto rendimento de nossa personagem não poderia ser retratada com imagens. Isso nos levou a uma caminho que considero fundamental para a essência de nosso filme, que foi focar na paixão de Maria pela natação, que a fez nadar até seu último dia de vida.
Resumindo, todo o processo foi de grande aprendizado. Um aprendizado cinematográfico, mas sobretudo um aprendizado de vida. Entrevistamos diversas pessoas, atletas com mais de setenta anos, apaixonadas pelo esporte e com uma sabedoria de vida rara e comovente.
Para mim, foi uma honra e um processo transformador realizar o filme Maria Lenk – a Essência do Espírito Olímpico.

No vai-e-vem da metrópole, entre dois viadutos enormes, um rio morto, carros, ônibus, buzinas e poluição, está guardado um pedaço da história da natação brasileira. Quem passar apressado certamente não vai notar, mas na praça Bento Camargo de Barros, hoje ocupada por catadores de papel e moradores de rua, fica um discreto portão vermelho que dá entrada a Associação Atlética São Paulo.

Primeiro clube que Maria Lenk treinou

Fundada em 1914, a AASP já foi um dos grandes clubes da capital paulista. Em um passado não muito distante, foi precursora do remo, disputado no então limpo rio Tietê, e campeã de basquete. A Associação também abriga a primeira piscina olímpica da América Latina, onde Maria Lenk começou a dar suas braçadas rumo às competições e Olimpíadas.

O cenário, hoje espremido entre uma churrascaria e um terreno baldio, é uma das locações do documentário “Maria Lenk – A essência do espírito olímpico”, um dos finalistas do edital Memória do Esporte Olímpico Brasileiro. Foi lá que, em um domingo pela manhã, encontramos o diretor Iberê Carvalho e sua equipe.

Pouco antes eles haviam filmado no Clube de Regatas do Tietê, do outro lado da rua, onde Lenk também nadou, e seguiam para o local onde antes era a casa da atleta, a duas quadras de distância. “Olha como era pertinho, ela ia treinar a pé”, diz Iberê, admirado.

“Quando a gente partiu para a pesquisa, estávamos com uma ideia de contar todas as façanhas da Maria Lenk. Ao estudar a vida dela, percebemos que ela foi pioneira em tudo que fez e queríamos mostrar isso. Mas isso também estava me angustiando. ‘Como eu vou contar essa história em 26 minutos?’, pensava. O caminho então foi remontar a biografia dela e procurar um olhar que saísse do convencional”, relata.

Piscina da Associação Atlética de São Paulo em que Maria Lenk treinava

Iberê compartilha um pouco do processo de criação do documentário: “Partimos de uma reconstrução da biografia, que é complexa de fazer porque se trata da memória das pessoas. Fizemos uma pré-pesquisa e a partir disso definimos quem seriam os personagens que nos ajudariam a contar a história da Maria Lenk. Trabalhamos em cima de um roteiro inicial, supondo que essas pessoas seriam as entrevistadas definitivas do filme. A partir disso, estabelecemos um guia. Só que desde que começamos a filmar eu nem peguei nele. Foram surgindo outras coisas, novos personagens. Cada dia eu tenho uma nova possibilidade de viés para seguir.”

Estamos em frente à fachada da casa de Maria Lenk. A rua, no bairro da Ponte Pequena, tem pouco movimento e muito lixo na calçada. Um caseiro da propriedade em frente nos conta que os donos derrubaram o sobrado por dentro para “evitar que invasores morassem lá”. “O rio passava aqui perto antes de desviarem o curso”, comenta, “vivo aqui desde criança”.

Sob Sol forte, Iberê diz que hoje, o que mais lhe encanta é “falar do tempo”. “Porque todas essas pessoas, principalmente as mais idosas, falam com saudade daquele tempo, mas também estão superativas com 80 ou 90 anos. Nenhum deles se aposentou, a maioria ainda nada. Queremos falar sobre como a nossa sociedade lidou com a passagem do tempo, como os atletas lidaram e, principalmente, a Maria Lenk. Ela nunca parou. Hoje entrevistamos o jornalista Henrique Nicolini e ele nos disse que o maior ensinamento da Maria Lenk é que o esporte não termina aos 25 anos. Ou seja, a parte olímpica da vida dela é fundamental para a sua personalidade pública, mas o que a diferencia não é o que ela fez em sua fase de atleta de alto rendimento, mas sim que ela nunca parou.”

A equipe prepara a câmera. O diretor se lembra de uma entrevista que realizou com Lenk em 2004, três anos antes de sua morte. “Perguntei a ela como foi parar de nadar, querendo me referir às competições. Ela me olhou séria e disse: ‘eu nunca parei’. Hoje nós filmamos o vestiário do Tietê e, além dos depoimentos, estamos tentando buscar imagens que demonstrem a passagem do tempo. O tempo é inexorável, mas não é determinante como você vai lidar com isso. A nossa sociedade é hoje muito descartável, e a gente vai destacando o que é mais antigo.”

Diante do que foi aquela casa, a Associação Atlética, o Clube Regatas do Tietê e o próprio rio, a fala de Iberê ganha força.

“Mas eu posso mudar de ideia na ilha de edição”, sorri o diretor, deixando no ar o resultado final do documentário.

A nadadora Maria Lenk

“Maria Lenk – a essência do espírito olímpico” resgatará os momentos marcantes da vida de uma das mais importantes atletas que o Brasil já teve a partir de depoimentos exclusivos e inéditos da própria nadadora.

Em 2004, a Pavirada Filmes, de Brasília (DF), iniciou de forma independente a produção de um documentário longa-metragem chamado “Lenk, o prazer de existir”. A proposta era construir uma cine-biografia sobre Maria Lenk, a primeira mulher brasileira a participar de uma Olimpíada, em Los Angeles 1936.

A equipe gravou Maria Lenk em vários momentos entre 2004 e 2005. Os encontros resultaram em aproximadamente 30 horas de material gravado. Então com 90 anos, Lenk estava lúcida e vivaz, enfrentando as dificuldades naturais à longevidade. “Minha filosofia é: a gente não pode pretender prolongar a vida, mas enquanto vivemos através do esporte, a gente pode viver mais.”

Em 2007 Lenk faleceu de parada cardíaca enquanto nadava na piscina do Parque Aquático do Flamengo.

“Maria Lenk – a essência do espírito olímpico” é um novo projeto. Um documentário média-metragem que permitirá compartilhar com todos os brasileiros as histórias e recordações generosamente contadas por Maria Lenk há seis anos. Um material único, de valor inestimável para a memória do esporte olímpico brasileiro.

Apresentação do projeto “Maria Lenk” durante o pitching

Ficha técnica:

Documentário: “Maria Lenk – a essência do espírito olímpico”

Produtora: Pavirada Filmes e Produções Ltda.

Diretor: Iberê Carvalho

Localidade: Brasília (DF)

O Salto de Adhemar


Medalhista de ouro no salto triplo das Olimpíadas de Helsinque (1952) e Melbourne (1956), ele também “foi uma pessoa que combateu o preconceito e promoveu o atletismo no país”, ressalta o diretor Rafael Terpins. Adhemar foi adido cultural, professor da Febem e até mesmo ator em “Orfeu negro”, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1960.

Gravação do DOC O Salto de Adhemar. Foto: Rafael Terpins

Thiago Brandimarte Mendonça e Rafael Terpins respondeu algumas questões sobre o documentário.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi  pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Foi um imenso prazer entrar no universo de Adhemar Ferreira da Silva, o  primeiro grande campeão olímpico brasileiro. Sua vida foi intensa e permeada de coincidências e acontecimentos que a tornam um prato cheio para a realização de um filme. Adhemar é fruto do acaso, mas também uma construção consciente de atleta e cidadão. Sua trajetória é circular: da origem humilde na Casa Verde à meteórica ascensão olímpica. No fim a queda, a nova superação e a volta à origem, onde procura passar os conhecimentos aprendidos em seu tortuoso caminho.

O processo de realização do documentário foi natural. Nos deixamos levar pela história deste atleta e a riqueza de suas histórias nos indicou as escolhas estéticas e narrativas do filme. O início de sua vida na pobreza de São Paulo é acompanhada por um desejo de ascensão. A descoberta ao acaso do talento para o atletismo e suas vitórias coincidem com a percepção do preconceito por parte dos próprios atletas. A superação não afasta Adhemar da consciência de seu lugar em uma sociedade racista. Ele percebe logo que precisa superar-se não só nas pistas. Faz quatro universidades, aprende diversas línguas, comunica-se com o mundo e reage às ofensas. Torna-se ator, adido cultural na Nigéria, jornalista, professor. Volta-se para as crianças marginalizadas, seus iguais, dando aula nas Febens da vida. A consciência de si torna-se consciência dos seus. É esta trajetória única e exemplar que tentamos mostrar no filme.

Duas escolhas estéticas foram centrais: a primeira foi utilizar animações para a reconstituição de época, baseadas em grande parte no modernismo dos cartoons da década de 50, principalmente no trabalho da produtora UPI e no tratamento dado aos desenhos do Mr. Magoo. Acabamos por trabalhar com aquarelas e tinta a óleo para dar um aspecto mais quente e manual para o filme. A segunda foi a descoberta na pesquisa de um extenso material de arquivo filmado pelo próprio Adhemar na Nigéria em super 8, mostrando o cotidiano deste país. Percebemos que as famílas nigerianas que ali apareciam poderiam representar a família de Adhemar 50 anos antes, sendo sua mãe representada por tantas outras mães negras nigerianas. As imagens de super 8 nos deram um ganho simbólico no campo da representação, mas também no campo narrativo. Adhemar repete em suas entrevistas que havia descoberto na Nigéria que seu avô fora um rei, e que ele era um príncipe. De fato Adhemar ostenta postura nobre, intangível, um Xangô, como disse sua filha.

O trabalho com a equipe foi excelente: da empatia com o fotógrafo, Humberto Bassanelli, à liberdade de trilhar um caminho não convencional que tivemos das produtoras Elisa Chalfon e Luana Binta. Fundamental também foi o envolvimento dos familiares. Diego, o neto de Adhemar, acabou tornando-se co-roteirista.

Para nós o sonho de Adhemar foi uma lição. Mesmo nas condições precárias em que o esporte se desenvolve no país ele se superou e passou seus conhecimentos para outros jovens que também sonhavam com o estrelato das pistas. Nas palavras do medalhista Nelson Prudêncio, Adhemar tirou a catarata dos olhos de muitos. Mostrou a importância da auto-construção do cidadão para além do atleta. E é com felicidade que dividimos com público agora o Salto de Adhemar.

Como se deu a sua escolha de falar sobre o Adhemar? Qual é a sua relação com o mundo esportivo?

Rafael Terpins e Thiago Mendonça diretoers do Documentário O Salto de Adhemar. Foto: Leonardo Pietrocola

Já joguei basquete com uma breve passagem no high school americano e defendi a seleção judaica brasileira. Cheguei a treinar com os veteranos da Hebraica marcando os eternos pivôs da seleção Gerson e Israel. Hoje sou praticante e entusiasta do Kung Fu na ASKF, o esporte sempre me deu muito prazer e faz parte da minha vida.

O Thiago já trabalhou o tema esportivo no documentário Fora de Campo (co-direção com Adirley Queirós) quando seguiu a vida de ex-jogadores de futebol na segunda divisão brasiliense.

Um amigo indicou o Adhemar como tema para o edital e ficamos fascinados com sua história, e mais impressionados com a ignorância geral com esta lenda do esporte nacional.

Descreva o Adhemar que vc tinha na cabeça antes de começar a se apropriar do documentário e agora?

O Adhemar, para mim, era um atleta natural, um fenômeno que já nasceu pronto. Uma pessoa curiosa com uma certa tendência artística, uma facilidade enorme para línguas e uma veia diplomática. Após o início do documentário, percebi que ele era muito mais do que isso. O Adhemar tinha uma verdadeira obsessão por conhecimento, aplicação nos treinos e para com a vida ao mesmo tempo que borbulhava uma veia artística latente. O que mais nos impressionou foi seu lado “Forrest Gump”, sua história se confunde com a história do país. Foi escultor na oficina de Brecheret, atuou na peça Orfeu e Negro de Vinicius de Morais e desempenhou o papel da morte no flme de mesmo nome de Marcel Camus, foi desafeto de Janio Quadros e hospedou Pierre Fatumbi Verger na sua casa na Nigéria.

Diego, neto do atleta Adhemar, fala sobre as lembranças so seu avô. Foto:Rafael Terpins

Com quais personagens você gravou? Conta um pouco sobre esses momentos.

Tivemos depoimentos deliciosos. Gravamos com Nelson Prudêncio, ex-triplista medalhista na olimpíada do México 68 na UFSCar, onde ele nos deu uma verdadeira aula de dinâmica de movimento no salto triplo.

Conversamos com Wanda dos Santos que, com 16 anos acompanhou Adhemar na sua primeira conquista olímpica. Wanda já tem quase 80 anos, mas continua treinando e disputando nas barreiras mundo afora.

Fiha de Adhemar, a canotora Adyel fala sobre a vida do pai. Foto: Rafael Terpins

Conversamos com Luís Roberto, amigo pessoal de Adhemar que participou de projetos sociais com o atleta e nos contou sobre esta obsessão de Adhemar em conhecer a cultura e idiomas antes de viajar para o local.

Também gravamos com a família. O neto Diego contou da figura paterna que foi seu avô e de sua busca por documentar sua trajetória. Adyel nos presenteou com um relato emocionante onde passamos por toda vida de Adhemar, de seu nascimento até seu legado. Adyel é cantora e leva adiante a carreira que seu pai desejava ter antes de ser descoberto para o atletismo.

Você tem uma forte referência nas suas direções com a animação. Como vai se dar este cruzamento com o Adhemar?

Nossa idéia inicial era utilizar a animação para descrever períodos. Localizar o espectador na década de 50, 60 e assim por diante.

Já havíamos captado o triplista Jefferson Sabino saltando com câmeras de alta velocidade para ilustrar os momentos da vida do atleta em um paralelo com sua modalidade.

Acontece que o artista Adhemar Ferreira da Silva, nos deixou um tesouro escondido. Localizamos uma coleção incrível de imagens captadas durante os anos de 1974 a 1977 na Nigéria em Super 8. Fazer filmes é um processo orgânico e este material nos fez repensar o roteiro e estamos levando o filme para uma outra direção. Muito mais condizente com o espírito multicultural de Adhemar Ferreira da Silva.

O que as pessoas vão assistir com este doc pronto?

A maioria das pessoas irão conhecer a história de Adhemar Ferreira da Silva. O primeiro brasileiro a entrar no Hall da Fama do Atletismo ao lado de Jesse Owens. Irão conhecer o artista, irão conhecer a pessoa obstinada e alegre mas principalmente irão entender por que Adhemar é o maior atleta do esporte Olímpico brasileiro.

Adhemar Ferreira da Silva

Adhemar Ferreira da Silva é o único atleta brasileiro que conquistou duas medalhas de ouro consecutivas em uma mesma prova em Jogos Olímpicos. Sua história é marcada pela superação dos limites e pelas coincidências que fizeram dele um grande nome, conhecido não só por seus recordes, mas também por seu carisma.

Nas Olimpíadas de Helsinque 1952, Adhemar quebrou o próprio recorde mundial quatro vezes. O estádio foi ao delírio. A comoção do público foi tanta na hora da premiação que o juiz pediu que Adhemar desse uma volta na pista agradecendo aos aplausos. Nascia assim a volta olímpica.

Foram coincidências que levaram Adhemar às pistas. Vindo de uma família pobre da Casa Verde, na Zona Norte de São Paulo, o atleta precisou trabalhar desde cedo para ajudar a família. Sonhava em ser cantor e até os 19 anos não sabia o que significava a modalidade em que iria competir.

Adhemar teve uma ascensão meteórica no esporte e sofreu as agruras e preconceitos de seu tempo ao abraçar um caminho pouco valorizado. Em 1953 era funcionário da prefeitura paulistana e foi atacado pelo então mandatário Jânio Quadros por faltar ao emprego para competir internacionalmente. “Vagabundo”, classificou Jânio. Parte da imprensa abraçou esse discurso e Adhemar acabou demitido. Seu último salto foi dado após o fim da carreira, quando dedicou-se a difundir o esporte entre crianças pobres, buscando apoiar jovens com histórias semelhantes a sua.

A vida de Adhemar é mais do que um exemplo de superação. Ela sintetiza as dificuldades e desafios dos atletas brasileiros no século passado. Vencer as próprias marcas e as competições, superar os recordes, mas também vencer a pobreza e o preconceito. Adhemar foi um exemplo – o atleta por vocação, o grande campeão, o cultivador de sonhos para as novas gerações.

Rafael Terpins

Ficha técnica:

Documentário: “O salto de Adhemar”

Produtora: Bossa Nova Films Criações e Produções

Diretor: Rafael Terpins e Thiago Brandimarte Mendonça

Localidade: São Paulo (SP)

Ouro, Prata, Bronze e...Chumbo!


José Roberto Torero, é jornalista e escritor. É diretor do DOC sobre Afrânio Costa, Dario Barbosa, Fernando Soledade, Guilherme Paraense e Sebastião Wolf. A equipe brasileira de tiro de 1920, que foram os nossos primeiros medalhistas.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Acho que o mais charmoso seria dizer que foi um sofrimento, mas que heroicamente, tavez até epicamente, conseguimos chegar ao fim do filme. Mas não foi nada disso. A pesquisa trouxe novos elementos para o roteiros e as entrevistas foram interessantes. Quanto à fimagem, conseguimos atores ótimos e a filmagem foi tranquila, tudo saindo conforme o planejado. Talvez até melhor, pois inventamos novos planos e piadas. Na edição tivemos material de sobra, o que fez o filme ficar bem enxuto, e descobrimos um interessante material de arquivo. E a edição de som acrescentou mais uma camada de significados. Enfim, saiu tudo conforme o planejado, ou até um pouco melhor. Se houvesse um making off do processo, ele seria bem aborrecido, pois não houve um grande obstáculo a superar, um grande inimigo a vencer. Melhor assim.

Gravação do Documentário Ouro, prata e…Chumbo Foto:Jozzu

Conta um pouco da sua escolha em contar essa estória?

Duas coisas me chamaram a atenção para esta história. A primeira, óbvia, é o fato de ser a primeira vez em que o Brasil consegue medalhas olímpicas. A segunda foi a odisseia que os atletas tiveram que enfrentar para chegar à competição. Foram de navio (com cabines tão ruins que eles dormiam no bar), mas no meio do caminho descobriram que não chegariam a tempo e tiveram que ir de Portugal a Antuérpia de trem (nem sempre em vagões de passageiros). Tiveram as munições e alvos roubados e conquistaram suas medalhas com armas emprestadas na hora da competição.

Vc escreve já há um tempo uma coluna sobre futebol. O que te interessa no mundo olímpico?

A mesma coisa que no futebol: as histórias dos atletas, suas batalhas, suas graças e desgraças.

Fale um pouco das entrevistas. Quem e o que vc encontrou pelo caminho?

Entrevistamos familiares de dois atletas, Guilherme Paraense e Afrânio Costa, que ganharam ouro e prata individualmente (a equipe ainda ganhou um bronze coletivo). A neta do primeiro e o sobrinho—bisneto do segundo contaram um pouco o que as famílias sabem das histórias dos jogos e como eram os dois atletas. Depois falamos com o técnico da seleção brasileira e com uma atiradora, enfocando aspectos técnicos e emocionais do tiro.

O que vc espera desse documentário e o que as pessoas podem esperar dele?

Eu espero que as pessoas gostem e que se lembrem por muito tempo da história destes cinco sujeitos que tiveram que fazer várias peripécias para conquistar as primeiras medalhas para o Brasil. As pessoas podem esperar uma história diferente e contada de um modo pouco comum.

Torero, diretor do documentário. Foto:Jozzu
Guilherme Paraense, integrante da equipe de tiro na Olimpíada da Antuérpia, 1920

Todos nós adoramos as estreias: a primeira página do caderno novo, o primeiro beijo na boca, o primeiro maço de cigarro, a primeira vez… Mas, curiosamente, não damos muita bola para a primeira Olimpíada da qual participamos, a de 1920. E não faltam motivos para que nos interessemos pelos Jogos de Antuérpia: ali ganhamos nossa três primeiras medalhas (uma de cada metal) e tivemos nossa melhor colocação até hoje, um honroso 15o. lugar.

Mas poucos sabem que as três medalhas do Brasil foram obtidas pela equipe de tiro. o nome de Guilherme Paraense é até citado como nosso primeiro ouro, contudo não sabemos que era um tenente e muito menos que competiu com uma arma emprestada por um competidor americano.

Quanto ao vencedor da medalha de prata, não sabemos que seu nome era Afranio Costa e que chegou a ministro do Tribunal Federal de Recursos, algo como o STF de hoje.

E sobre os outros cinco que ganharam a medalha de bronze por equipe? Desses não sabíamos nada mesmo. Não sabemos que, além de Afranio Costa e Paraense, havia o médico gaúcho Dario Barbosa, com seu vasto bigode, o alemão (sim, alemão) Sebastião Wolf, que tinha 51 anos na época, e o médico Fernando Soledade, que competia com um imenso chapéu que lhe dava um ar de guarda florestal.

Estes nossos primeiros medalhistas viveram uma epopéia. Para começar, viajaram num navio tão ruim que, em vez de dormirem na cabine, dormiam no bar, depois da saída do ultimo cliente. Mas o pior foi quando perceberam que o lento navio não chegaria a tempo na Bélgica. Então desceram em Lisboa e fizeram o resto de trem, boa parte em vagão descoberto.

Pois bem: não sabemos quase nada desses nossos heróis olímpicos. E é uma pena, porque suas histórias são excelentes. Eles fora, o primeiro a vencer. E os primeiros a serem esquecidos. Até agora, quando terão suas trajetórias contadas nesse documentário.

Dividiremos o filme em cinco partes: viagem (com apresentação dos personagens), abertura das Olimpíadas, treinamento, primeiro dia de provas (com prata e bronze) e dia final, com a primeira medalha de ouro do Brasil.

José Roberto Torero

Ficha técnica:

Documentário: “Ouro, prata, bronze e… Chumbo”

Produtora: GW São Paulo Comunicação S/A

Diretor: José Roberto Torero Jr.

Localidade: São Paulo (SP)

Pátria


“É campeão no nosso coração”. Essa foi a saudação da torcida brasileira para o time vencedor da medalha de bronze na Olimpíada de Atlanta 1996. Fernanda Venturini, Ana Moser, Márcia Fu, Hilma, Ana Flávia, Ida, Ana Paula, Virna, Leila, Fofão, Filó e Sandra perderam a semi-final para Cuba, mas conseguiram conquistar a vitória em cima da Rússia na disputa pelo terceiro lugar. Era a primeira vez que o voleibol feminino brasileiro subia ao pódio olímpico.

Da esq. para a dir.: Rune Tavares, produtor executivo, Luiza Goulart, roteirista, e Fábio Meira, diretor de “Pátria”

“Essa é a história que queremos contar. A de um time que não ganha o posto máximo mas tem uma força tão grande que o brasileiro consegue se reconhecer nelas e ver a vitória que elas tiveram”, conta, empolgado, o diretor Fábio Meira, da Acere Produções.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?

Foi um prazer concretizar um projeto antigo, esse é um filme que planejo há anos. O mais interessante foi encontrar um foco para que o filme coubesse em 26 minutos, resolvemos focar no momento mais emblemático dessa seleção, a semifinal contra Cuba nas Olimpíadas de Atlanta. Com isso, contamos algo que pouca gente conhece: a origem da rivalidade entre Brasil e Cuba no voleibol. Isso trouxe uma abordagem mais emocional ao filme, e coerência, já que essa equipe, com seu forte espírito de luta e superação, suscitou fortes emoções ao nosso país.

Na entrevista abaixo, ele e Rune Taveres, produtor executivo, explicam um pouco mais como será o filme “Pátria”, um dos documentários finalistas do projeto Memória do Esporte Olímpico Brasileiro. As gravações já começaram e o média metragem deverá estar pronto até junho deste ano.

Como vocês escolheram falar sobre essas 12 brasileiras?

Fabio Meira: Eu não sei exatamente quando eu comecei a acompanhar essa seleção. Acho que foi com aquela história da recuperação do joelho da Ana Moser. Eu lia isso nos jornais e me impressionava. Eu vi uma entrevista em que ela dizia que não aguentava mais responder se ia ou não jogar. Isso me impressionou. Como alguém consegue uma recuperação que deveria durar 6 meses em apenas 3 meses? Imagine toda a pressão que isso envolve! Eu comecei a admirá-la desde ali. E fui acompanhando os jogos de Atlanta, até que chegamos na semifinal, contra Cuba. Esse jogo passou às 23h, eu tinha 16 anos. O Brasil tinha ganhado de Cuba por 3 a 0 na fase preliminar e eu achei que, como estávamos na frente, poderia ir dormir que o resto já estava garantido. Mas daí Cuba ganhou o segundo set e eu fiquei acordado o resto da noite. O Brasil perdeu, foi super trágico. Aquele jogo mexeu muito comigo, me marcou muito. Tanto que eu continuei a seguir a carreira desse time durante anos. O filme existe por conta do fascínio que eu tenho por esse time. Não acho que nenhuma outra equipe de vôlei feminina teve tão próxima do público. Nós sabíamos o nome delas. Acho que a maioria não conhece da mesma maneira o time que ganhou ouro.

Quando você foi a Cuba estudar cinema?

Fabio Meira: Eu fui 9 anos depois. Fiquei meio com o pé atrás com Cuba.

Rune Tavares: Eu fui 4 anos depois e ainda peguei bem forte essa rivalidade. Em Cuba se joga muito vôlei e essa disputa Brasil-Cuba acontecia ali entre os estudantes mesmo. O jogo de Atlanta era sempre lembrado. Ali eu fui começar a ter uma ideia melhor do que representava tudo isso.

E no basquete também, não?

Rune Tavares: Eu não senti tanto isso no basquete. No dia a dia, morando lá, a rivalidade que saltou mais forte foi a do vôlei. Era esse jogo que vinha à tona. Os cubanos sempre tiravam a cartinha da manga para criticar.

Fabio Meira: As brasileiras foram melhor no basquete. A rivalidade era com Estados Unidos e Austrália.

Rune Tavares: Talvez essa seleção feminina de basquete fosse superior mesmo. E o processo que estamos contato aqui é o inverso: da seleção cubana historicamente superior e de quando o Brasil começa a virar esse jogo.

Fabio Meira: A Ana Paula [Rodrigues Connelly] falou em entrevista para nós: quando chegamos lá, as cubanas já eram as cubanas. Então as metas eram, por exemplo, ganhar um set delas. Depois dois. Ganhar um tiebreak. O trabalho das brasileiras foi tentar chegar lá. Isso é incrível porque elas conseguiram! Depois de dois anos elas já estavam ganhando campeonatos! Eu também estava em Cuba quando o Brasil perdeu para elas no Pan de 2007. Eu imagino que deva ser igual a um brasileiro estando em Buenos Aires num dia que o Brasil perde a Copa do Mundo de Futebol para a Argentina.

Rune Tavares: Tem um lance que eu acho muito bonito desse jogo de Atlanta que é aquele momento em que a Ana Moser pede respeito, com o dedo em riste. Eu acho que isso era muito claro também: por mais que tivesse brincadeira e gozação, foi a ocasião que Cuba reconheceu a seleção brasileira como sua igual no cenário mundial.

Fabio Meira: A Ana Paula disse que sabe localizar o momento em que as cubanas começaram a levá-las a sério: foi em 1994, quando ganharam o primeiro campeonato delas, um Grand Prix.

E quais outros momentos são importantes para contar essa história?

Fabio Meira: Com certeza o campeonato mundial feminino de 1994, aqui no Brasil. O público lotou tanto o Mineirinho, em Belo Horizonte, quanto o ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, e nós chegamos pela primeira vez na final de um campeonato mundial. A final, claro, foi contra Cuba.

E em Cuba, com quem vocês pretendem falar?

Fabio Meira: Com o técnico da seleção, com a Mireya Luis e com a Regla Torres, que está agora na comissão técnica da seleção feminina. A Mireya até pouco tempo estava no COI (Comitê Olímpico Internacional). Elas continuam muito ligadas à Federação de Vôlei.

Qual será a linguagem utilizada?

Rune Tavares: Não queremos só contar o jogo, mas a partir dele contar antes e depois. Queremos sempre voltar a esse jogo narrativamente, e sairmos dele para contar algo anterior. Ele será a alavanca.

Fabio Meira: Queremos demonstrar com o filme é que não se mede a força de um atleta, de um time, com uma medalha de ouro. Elas ganharam o bronze mas o efeito que elas tiveram na sociedade foi muito maior do que isso. Foi algo que transbordou ginásios e a televisão. As pessoas conseguiram sentir a força que elas tinham como time ali dentro.

Tanto que na volta elas foram ovacionadas.

Fabio Meira: Claro. Márcia Fu desfilou em carro de bombeiro em Juiz de Fora, outras em Belo Horizonte e São Paulo. O tratamento que elas receberam foi o mesmo do pódio, quando ouviram da torcida “é campeão no nosso coração”. Isso ocorreu no Brasil também. Essa é a história que queremos contar. A de um time que não ganha o posto máximo mas tem uma força tão grande que o brasileiro consegue se reconhecer nelas e ver a vitória que elas tiveram. O que para o esporte brasileiro é totalmente atípico.

Ana Moser discute com cubanas na semi-final da Olimpíada de Atlanta (1996)

O projeto Pátria tem o objetivo de contar a história da equipe que introduziu o Brasil na elite do voleibol mundial, com a medalha de bronze na Olimpíada de Atlanta de 1996 por Fernanda Venturini, Ana Moser, Márcia Fu, Hilma, Ana Flávia, Ida, Ana Paula, Virna, Leila, Fofão, Filó e Sandra. Era a primeira vez que o voleibol feminino brasileiro subia ao pódio olímpico.

Até então, o vôlei feminino não contava com tantos investimentos, e a partir do exemplo desse grupo vitorioso mudou-se a percepção, dando maior importância à modalidade. Quem não se lembra da fatídica semi-final outra Cuba? Talvez seja essa a principal recordação dos brasileiros em relação a essa equipe: valorizar aspectos negativos que não definem nem resumem essas grandes jogadoras.

Pátria contara com imagens de arquivo e entrevistas com atletas e comissão técnica, além de ouvir jogadoras de gerações anteriores, como Jaqueline e Isabel. O filme percorrera o caminho da conquista da medalha, visitando locais emblemáticos como o Mineirinho, o Maracanazinho, e o ginásio do Ibirapuera, onde chegaram pela primeira vez a uma final de um campeonato mundial, embalada por 25 mil torcedores.

O filme também ira em busca de Mireya Luís, antagonista dessa saga e notória algoz do Brasil, tricampeã olímpica, e do técnico da seleção cubana, Eugênio Jorge.

Fabio Meira, de “Pátria”

Ficha técnica:

Dcoumentário: “Pátria”

Produtora: Acere Produções Artística e Cultural

Diretor e roteirista: Fabio Meira

Localidade: São Paulo (SP)

Reinaldo Conrad: A Origem do Iatismo Vencedor


Murilo Salles, cineasta de longa data, com uma filmografia extensa e premiada é diretor do documentário que vai contar a trajetória do atleta Reinaldo Conrad.

Depois de 6 meses, o documentário nasceu. Como foi pra vc esse processo todo, desde a pesquisa até a finalização?
Foi uma honra e um prazer ter convivido durante esse tempo e aprendido tantas lições de vida com Reinaldo Conrad.

Porque Reinaldo Conrad?

Porque ele é um pioneiro e por causa da trajetória dele, que aprendeu a velejar numa represa, Guarapiranga e se tornou o primeiro medalhista olímpico da vela brasileira, numa regata no mar. Os desafios técnicos que enfrentou à época, onde havia uma enorme defasagem entre os velejadores dos países desenvolvidos e ele… E tem, também, um lado meu nisso, que é gostar de olhar para o esportista em seu desafio solitário, no mar, numa luta travada contra a natureza, com o barco. Isso é muito cinematográfico.

Em qual momento está o DOC?

Já filmamos a maior parte: ele navegando, em competição, tentando classificar para a Olimpíadas de Londres. Vamos no fim do mês filmar a parte mais “intimista”: primeiro, uma entrevista. Depois, ele e seu clube, onde se formou, onde treinava e virou uma referência da vela brasileira.

Quais estão sendo os desafios? Quais escolhas que estão sendo feitas em relação a linguagem?

Filmar um esporte tão singular quanto a vela impõe um pensar estético muito rigoroso, pois a competição – entre os velejadores – não é tão explicita visualmente tal como numa luta de box ou no volei, na natação, esportes onde a liturgia da “competitividade” é mais explícita. O velejador pode, numa competição, fazer um percurso diverso dos outros. Onde ele praticamente veleje solitário. Ele tem que cumprir um trajeto: a saída, o retorno e a chegada, mas, no mar não há raias. O que interessa numa regata é a concentração do velejador e de seu timoneiro em todos os detalhes e ajustes do barco ao vento, à correnteza, a maré e as ondas. É quase uma corrida contra desafios. Vencer esses desafios é mais importante do que ficar olhando para seus competidores. O que vai fazer de você um vencedor é a sua capacidade de superar com excelência os desafios que se apresentam durante a regata, o desafio não é o competidor… A vitória é uma consequência dessa concentração e da performance. Sempre.

Quem vc já entrevistou ? Como foi? O que vc pode relatar que te surpreendeu de alguma forma?

Ainda não entrevistei ninguém. Ando pensando muito nisso. Acho que o filme que estou fazendo é uma homenagem para um vencedor olímpico. Um olhar sobre o desafio de sua jornada existencial. Não queria fazer um filme jornalístico. Entrevistas são o que imperam no AR, no jornalismo televisivo. Quero emocionar o espectador pela contundência do relato da jornada existencial de Reinaldo Conrad.

O que as pessoas vão poder ver com : Reinaldo Conrad – o atleta do detalhe”?

As Pessoas vão perceber que é necessário muita paixão para ser um vencedor olímpico. Portanto, estou fazendo um filme sobre essa paixão.

Reinaldo Conrad (à esquerda)

A vida de Reinaldo Conrad nos leva aos primórdios tanto da prática do iatismo no Brasil como da formação dos campeões de medalhas. Nascido em 1942, em São Paulo, ele começou a freqüentar desde cedo o Yatch Club Santo Amaro, onde, ainda criança, ganhou dispais um barco Pingüim. Foi na aventura de aprender a velejar em SP que Reinald marcou a história desses esporte olímpico brasileiro para sempre.

Foi ele quem trouxe as duas primeiras medalhas olímpicas do iatismo para o Brasil (México 1968 e Montreal 1976). Participou em cinco edições dos jogos e sempre velejou com um muita emoção e criatividade, procurando minimizar as diferenças com as equipes de países mais desenvolvidos tecnologicamente.

Ao documentar a história de Reinald, o público conhecerá melhor a modalidade da vela, mas principalmente qual é o diferencial que faz os atletas brasileiros chegarem ao topo, histórico que começou com a fantástica trajetória desse atleta, que se prepara, ainda para ser o medalhista com com a idade mais avançada da modalidade. Seu objetivo é competir aos 74 anos na Olimpíada do Rio de Janeiro.

Murilo Salles

Ficha técnica:

Documentário: “Reinaldo Conrad: A Origem do Iatismo Vencedor”

Produtora: Cinema Brasil Digital

Diretor: Murilo Salles

Localidade: Rio de Janeiro (RJ)