Por Hélio Alcântara

 “O importante nos Jogos Olímpicos não é vencer, mas participar. O essencial na vida não é conquistar, e sim lutar bem.”       Os dizeres do Barão de Coubertin, estampados no placar, acima da entrada principal do estádio de Wembley, ilustravam o sentimento da época e apontavam o que deveriam ser os Jogos de Londres-48.

Após 12 anos de interrupção, por causa da II Grande Guerra (1941-45), os Jogos Olímpicos tentavam voltar a encantar um planeta sacudido por dois conflitos mundiais em apenas trinta anos.

Mesmo sofrendo as mazelas da guerra, Londres tinha conseguido resistir, garantindo um mínimo de condições para a realização do evento. Dá pra entender por que o mundo respirava uma atmosfera de reconstrução material e de valores. No próprio ano de 1948, a ONU (Organização das Nações Unidas) lançou a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, na tentativa de organizar e levar a cabo um mínimo de “regras de convivência” entre os povos, depois de tamanha barbárie, em pleno século XX.

A maioria dos países europeus estava em frangalhos e lutava para se recuperar rapidamente. A tentativa de transformar os Jogos em demonstração de solidariedade entre os povos (as guerras costumam provocar esse tipo de sentimento) fez com que a olimpíada de 48 fosse chamada informalmente de “Jogos da Amizade”.

Muitos dos competidores haviam lutado na guerra – isso deixou os Jogos com uma cara peculiar, uma mistura de “universo olímpico-militar”, com a rigidez e a disciplina do sistema militar e a disposição de participar e compartilhar respeitosamente as duas semanas de competição com outros povos.

Por causa do conflito que terminara três anos antes, nem Japão nem Alemanha foram convidados. O mundo estava traumatizado com o extermínio de milhões de judeus e ainda levaria algum tempo para aceitar os alemães como parte da comunidade olímpica. A URSS também não participou. Em compensação, países que jamais haviam disputado uma edição dos Jogos estavam em Londres: Venezuela, Ceilão, Líbano, Síria e Birmânia.

A improvisação fez parte do universo dos Jogos de Londres. A Vila Olímpica, por exemplo, foi acomodada em “barracões da Força Aérea Real”, mas recebeu apenas os homens. As mulheres ficaram longe dali, hospedadas no Victoria College.

Havia racionamento de comida. Com a ajuda de outros países, foi possível se garantir a alimentação dos atletas – sem grandes variedades. Mas alguns países levaram sua própria comida, como argentinos, irlandeses, franceses e americanos.

DESTAQUES E CURIOSIDADES

Em Londres surgiu um dos maiores atletas de todos os tempos – como muitos, oriundo do Exército. Na primeira metade do século 20, com a expansão do comunismo e o desejo soviético de mostrar superioridade também no esporte, a maioria dos atletas desses países foi forjada entre os militares.

Emil Zatopek não era exceção. Era tão bom que ganhou um apelido: “Locomotiva Humana”. Tenente da então Tchecoslováquia, ele foi a sensação na prova dos 10 mil metros e por muito pouco não ganhou também os 5 mil. Alguns dizem que foi tão grande a superioridade de Zatopek, que os árbitros se perderam na contagem das voltas dos competidores – acabaram anunciando apenas os seis primeiros colocados (na prova dos 10 mil metros, Zatopek chegou 48 segundos à frente do segundo colocado).

Os Jogos de Londres-48 apresentaram um erro histórico. Na prova dos 200 metros rasos, o jamaicano Herbert McKenley largou um metro atrás da posição correta – os organizadores erraram na definição da marca do atleta. O resultado disso? McKenley correu 201 metros e chegou em 4º lugar. Ele era o favorito da prova e, com a diferença, poderia ter vencido. E ficou por isso mesmo.

Francina Elsje Blankers-Koen, da Holanda, foi a sensação feminina. Aos 30 anos de idade e mãe de dois filhos, “Fanny” pulverizou as adversárias nas provas de 100 m, 200 m, 80 m com barreiras e revezamento 4×100 m rasos. Por causa da não realização das duas edições olímpicas, em 1940 e em 44, “Fanny” perdeu “oito bons anos de atletismo”, segundo ela mesma. Ficou conhecida como a “Rainha dos Jogos”.

A delegação americana se destacou como um todo. Aproveitou-se da ausência de alemães e soviéticos e venceu várias provas. Na natação, por exemplo, ganhou tudo no masculino e quase tudo no feminino – perdeu apenas em uma das modalidades. Mas teve em Bob Mathias um fenômeno. Com apenas 17 anos, o atleta-adolescente conquistou a medalha de ouro no decatlo, transformando-se no campeão olímpico mais jovem de todos os tempos no atletismo.

O BRASIL E SEUS ADVERSÁRIOS NOS JOGOS DE LONDRES-48

Pela primeira vez, a delegação brasileira viajou de avião para participar de uma olimpíada. Ainda assim, a preparação brasileira para os Jogos de Londres-48 sentiu os efeitos da guerra. Mesmo que o país não tenha participado ativamente do conflito mundial, o esporte sofreu, ao ser visto como algo “supérfluo”. Faltava o básico, e os atletas tinham de se virar para fazer parte dos Jogos Olímpicos. Além disso, nenhum atleta era atleta apenas – não se pode esquecer de que na época o “espírito amador” imperava. Todos tinham uma profissão e, por isso, os treinamentos eram feitos à noite e em condições nem sempre favoráveis. Para coroar a má preparação, toda a comida enviada por navio para garantir uma boa alimentação aos atletas nunca chegaria a Londres…

No basquete, não havia tênis próprios para essa modalidade. E o treinamento era baseado nos exercícios físicos militares gerais. Como também não havia dinheiro suficiente, viajaram para a Inglaterra apenas os dez jogadores e o técnico da seleção brasileira. E boa sorte!

Contrastando com a penúria brasileira, os atletas americanos esbanjavam riqueza sob todos os aspectos. Haviam levado equipamentos específicos para treinamento, e cada jogador tinha uma bola de basquete para treinar. Os brasileiros tinham duas bolas para todos. Esse relato é de Alberto Marson, integrante da equipe brasileira nos Jogos de Londres-48, em depoimento à Katia Rubio, no livro “Heróis Olímpicos Brasileiros”.

Mesmo com todas as dificuldades enfrentadas, a Seleção Brasileira de Basquete conquistou a medalha de bronze, ao vencer sete jogos e perder apenas um – para os franceses. E ainda trouxe na bagagem uma revelação: Zenny de Azevedo, o “Algodão”, que acabaria se tornando um dos maiores atletas do nosso basquete. “Algodão” entrou no time no lugar do titular Évora e não saiu mais.

Quanto às demais modalidades, três brasileiros se saíram bem no atletismo e no pugilismo. Na prova de salto triplo, Geraldo Oliveira (5º) e Hélio Coutinho da Silva (8º) foram os melhores. No boxe, Ralph Zumbano, tio de Eder Jofre, futuro bicampeão mundial, chegou até as quartas-de-final no peso-leve.

Para nós, hoje, é curiosa e importante a participação de um brasileiro de 21 anos que terminou a prova do salto triplo em 14º lugar: o fantástico Adhemar Ferreira da Silva, que faria história e se tornaria bicampeão olímpico nas duas edições seguintes.

A título de curiosidade, o Brasil estreou nos Jogos de Londres-48 as modalidades do hipismo e do basquete feminino. Mais tarde, ambos conquistariam medalhas importantes na história dos Jogos.

Quando: 29/07/1948 a 14/08/1948

Países Participantes: 59

Total de atletas: 4104 (masculino: 3714; feminino: 390)

Total de modalidades: 19

Total de medalhas distribuídas: 411

Participação do Brasil: 34º lugar

MEDALHA BRASILEIRA

Modalidade: Basquete

Prova: Masculino

Atletas: Affonso Azevedo Évora, Alberto Marson, Alexandro Gemignani, Alfredo Rodrigues da Motta, Guilherme Rodrigues, João Francisco Braz, Luiz Benvenuti, Marcus Vinicius Dias, Massinet Sorcinelli, Nilton Pacheco de Oliveira, Rui de Freitas, Zenny de Azevedo.

Resultado: Medalha de Bronze

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