Por Hélio Alcântara

Podemos usar o velho chavão “divisor de águas” para falar dos Jogos Olímpicos de Los Angeles-32. Para começar, os Jogos atravessaram o oceano e, pela primeira vez, foram disputados fora da Europa. Além disso, as competições ficaram confinadas a um mesmo período, sem interrupção – em quinze dias (de 30 de julho a 14 de agosto) tudo estava terminado. E até aquele ano, nenhuma vila olímpica havia sido construída para o evento – foi também a primeira vez que isso ocorreu na era dos Jogos Modernos.

Todas essas mudanças se deram em um país que três anos antes havia mergulhado profundamente em uma profunda depressão econômica. Algumas das novidades foram inclusive determinadas por essa condição.

Em termos simples e diretos, o “crash” ou a quebra da Bolsa de Nova York foi o resultado de algumas ações equivocadas por parte dos americanos que comandavam a política econômica do país, aliadas à situação geral da Europa do pós-guerra.

Há economistas que garantem, sem medo de errar, que a “Grande Depressão” de outubro de 1929 ocorreu porque a política monetária dos Estados Unidos foi planejada de maneira catastrófica nos anos 1910 e 20. Houve um entendimento equivocado sobre a situação econômica do país: onde se via inflação havia, de fato, deflação.

Outros afirmam que os EUA criaram uma espécie de “bolha” (situação interna irreal) de consumo (expansão do crédito e grandes facilidades de pagamento), sem perceber que os europeus estavam se recuperando da miséria provocada pela guerra mais rapidamente do que imaginavam.

De repente, os americanos, que enriqueceram velozmente nos anos que se seguiram ao fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), ao vender inúmeros produtos para os europeus, tiveram suas exportações reduzidas drasticamente.

A produção industrial pisou nos freios, o comércio foi praticamente paralisado, a oferta ficou bem maior do que a demanda – não havia mais compradores –, os estoques se acumularam, as ações despencaram e a Bolsa quebrou. E o desemprego brotou, sólido e sadio.

Certamente, todas as explicações se complementam.

O cenário descrito acima foi basicamente o encontrado pelas delegações olímpicas dos 37 países quando desembarcaram em Los Angeles, em julho de 32. Essa situação acabou definindo formato, duração e “tamanho” dos Jogos Olímpicos daquele ano. A partir de Los Angeles-32, o sistema de disputa concentrado em um período apenas seria adotado por todas as cidades.

A escolha da cidade de Los Angeles, na costa do Pacífico, teve uma explicação determinante. Pra quem não sabe, o estado da Califórnia foi o único a não ser afetado completamente pelo “crash”. Setores da iniciativa privada conseguiram se manter de alguma maneira e, ao lado do governo californiano, investiram nos Jogos Olímpicos. A construção da vila olímpica só foi possível por essa associação.

Outra obra que precisou de muito dinheiro (quase 1 milhão de dólares na época) para ser realizada foi a ampliação do Estádio Coliseum. A partir dos Jogos, sua capacidade seria de 100 mil espectadores – até aquela data eram 76 mil lugares.

Mesmo com a situação econômica grave, os americanos queriam mostrar ao mundo sua capacidade de organização. E as inovações se transportaram também para os serviços de cronometragem, fotografias eletrônicas de chegada, divulgação de resultados para a imprensa e transmissão simultânea de todas as modalidades esportivas por duas estações de rádio.

A localização de Los Angeles provocou enormes dificuldades de transporte para a maioria das delegações – não podemos esquecer que a Califórnia era praticamente um deserto, em 1932. Os trinta e sete países participantes enviaram um total de 1.332 atletas (126 mulheres) para a costa oeste americana – metade do número de participantes dos Jogos de Paris-24 e de Amsterdam-28.

A delegação brasileira também enfrentou vários problemas para enviar os atletas. A dificuldade financeira acabou definindo boa parte da equipe que disputaria os Jogos.

Os 82 atletas (81 homens e apenas uma mulher) embarcaram no navio Itaquicê, entre centenas de sacas de café estocadas no porão. Para custear as próprias despesas na competição, eles tiveram de vender o produto ao longo da viagem. Um mês depois do embarque, 67 atletas desceram do Itaquicê, no porto de San Pedro, em Los Angeles. Os chefes da delegação brasileira fizeram a seleção, baseada naqueles que tinham “reais” chances de medalhas.

Maria Lenk, paulista de ascendência alemã, foi exceção. Com apenas 17 anos e inexperiente em competições desse porte, ela fora convidada por ter se destacado em um campeonato interestadual de natação. Acabou se tornando a primeira atleta sul-americana a competir em uma Olimpíada. “O que valia era o conceito do amadorismo. Eu competi com um uniforme emprestado, que tive de devolver quando as provas acabaram”, disse ela, certa vez, em uma entrevista.

Durante os trinta dias de viagem, Lenk não conseguiu treinar uma vez sequer – não havia piscina na embarcação. Isso quer dizer que ela entrou para disputar a primeira das três provas (100 m nado livre, 100 m costas e 200 m peito) apenas com os treinamentos que havia feito sozinha no Brasil. Nos 200 m nado peito, a brasileira saiu-se melhor, chegando em oitavo lugar. “Nada mal para quem só tinha participado de competições no Tietê e de um interestadual”, segundo ela mesma diria anos depois. Mesmo assim, ao voltar ao Brasil, foi bastante criticada por não ter conquistado nenhuma medalha. (!)

OS DESTAQUES DOS JOGOS

O destaque feminino nos Jogos de 1932 foi a atleta polonesa Stanislawa Walasiewicz: estabeleceu o recorde mundial nos 100 metros, com o tempo de 11”9 (onze segundos e nove décimos), e recebeu o título de “mulher mais rápida do mundo”.

Os americanos ficaram em primeiro lugar no quadro de medalhas (103 no total, 41 de ouro). Depois, vieram italianos (36 no total, 12 de ouro) e franceses (19 no total, 10 de ouro). Nenhum atleta brasileiro subiu ao pódio em qualquer das modalidades disputadas.

Quando: 30/07/1932 a 14/08/1932

Países participantes: 37

Total de atletas: 1332 (masculino: 1206; feminino: 126)

Total de modalidades: 16

Total de medalhas distribuídas: 346

Participação do Brasil: sem medalhas

 

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